ARTIGO ORIGINAL / ORIGINAL ARTICLE

Elaboração de um ranking da transparência e compreensão das práticas de gestão de municípios integrantes do COREDE Missões-RS

Elaboración de un ranking de transparencia y comprensión de las prácticas de gestión de los municipios miembros del COREDE Missões-RS

Elaboration of an index of transparency and understanding of management practices of the municipalities  of COREDE Missões-RS

Micheli dos Santos

Mestrado em Desenvolvimento e Políticas Públicas pela Universidade Federal da Fronteira Sul

Assistente em Administração da Universidade Federal da Fronteira Sul, campus Cerro Largo/RS.

 http://lattes.cnpq.br/3995648578116404

micheli.santos@uffs.edu.br

 

Monize Sâmara Visentini

Doutora em Administração pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e Mestre em Administração pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM).

Professora Adjunta do Curso de Administração da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS). Professora do Quadro permanente do Programa de

Mestrado em Desenvolvimento e Políticas Públicas (UFFS)

http://lattes.cnpq.br/6482101738421142

monize.visentini@uffs.edu.be

 


Resumo: Este trabalho visa compreender como os gestores públicos dos municípios integrantes do COREDE Missões-RS percebem as práticas de gestão da transparência, qualificada a partir dos respectivos portais eletrônicos. A seleção dos municípios ocorreu a partir do estabelecimento do Índice de Transparência na Gestão Pública Municipal (ITGP-M), elaborado para dar subsídios a esta investigação. A partir do ITGP-M foram realizadas entrevistas semiestruturadas com 10 gestores públicos municipais, por meio de um estudo exploratório e qualitativo. As entrevistas foram analisadas com suporte da técnica de Análise de Conteúdo, a qual resultou na classificação de dez categorias. Os resultados apontam certa resistência quanto à disponibilização de informações, predominando ainda a cultura patrimonialista. Os dados de disponibilização obrigatória são fornecidos sem ressalvas, enquanto os demais passam por “filtro” da administração, o que tem impedido a efetividade da Lei de Acesso à Informação (LAI).

Palavras-chave: Transparência; Lei de Acesso à Informação; Municípios.

 

Abstract: This work aims to understand how the public managers of the municipalities belonging to COREDE Missões-RS perceive the management practices of transparency, qualified from the respective homepages. The selection of the municipalities took place after the establishment of a Local Government Transparency Index (ITGP-M in Portuguese), prepared to provide subsidies to this investigation. From ITGP-M, semi-structured interviews were conducted with 10 municipal public managers, through an exploratory and qualitative study. The interviews were analyzed with the support of the Content Analysis technique, which resulted in the classification of ten categories. The results indicate some resistance regarding the availability of information, with a patrimonial culture predominating. The mandatory disclosure data are provided without reservations, while the others are "filtered" by the administration, which has prevented the effectiveness of the Freedom of Information Act (FOI).

Keywords: Transparency; Freedom of Information Act; Municipalities.

 

Resumen: Este trabajo pretende comprender cómo los gestores públicos de los municipios integrantes del COREDE Missões-RS perciben las prácticas de gestión de la transparencia, calificada a partir de los respectivos portales electrónicos. La selección de los municipios ocurrió a partir del establecimiento del Índice de Transparencia en la Gestión Pública Municipal (ITGP-M), elaborado para dar subsidios a esta investigación. A partir del ITGP-M se realizaron entrevistas semiestructuradas con 10 gestores públicos municipales, por medio de un estudio exploratorio y cualitativo. Las entrevistas fueron analizadas con soporte de la técnica de Análisis de Contenido, la cual resultó en la clasificación de diez categorías. Los resultados apuntan cierta resistencia en cuanto a la disponibilidad de informaciones, predominando aún la cultura patrimonialista. Los datos de disponibilidad obligatoria se suministran sin salvedades, mientras que los demás pasan por "filtro" de la administración, lo que ha impedido la efectividad de la Ley de acceso a la información (LAI).

Palabras clave: Transparencia; Ley de acceso a la información; Municipios.


 


Texto completo em português: http://www.apgs.ufv.br

Full text in Portuguese: http://www.apgs.ufv.br


INTRODUÇÃO

A temática transparência na gestão pública vem ganhando destaque nos últimos anos, sendo o acesso à informação reconhecido por importantes organismos da comunidade internacional como direito humano fundamental (CGU, 2013). Prova disso foi a realização, no ano de 2003, da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção (CNUCC), cujo texto foi aprovado pelo Congresso Nacional, por meio do Decreto Legislativo nº 348, de 18 de maio de 2005, e, posteriormente, promulgado pelo Decreto nº 5687, de 31 de janeiro de 2006, passando a vigorar no Brasil com força de lei.

Para além do destaque internacional do direito de acesso à informação, outro fator que contribuiu para a aceitação dessa prerrogativa foi a democratização de vários países a partir dos anos 90, aliado ao desenvolvimento das Tecnologias de Informação e Comunicação ‒ TICs, que mudaram a relação das sociedades com a informação e o uso que fazem dela. Em 1990, apenas treze países haviam adotado leis que garantiam ao cidadão o acesso à informação, enquanto que atualmente cerca de noventa países de todos os continentes já possuem leis nacionais que regulam este acesso (CGU, 2013).

Anterior à década de 90, no Brasil, a Constituição Federal da República (CF, 1988) estabelecia, no artigo 37, os princípios que regem a administração pública, sendo eles: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Nesse contexto, surgiu a transparência, como um outro princípio, vinculado ao da publicidade, hoje regulamentada pela Lei nº 12.527/2011, que regula o acesso à informação.

O que motiva a realização desta pesquisa é o pressuposto de que, mais do que atender às prerrogativas legais impostas pela legislação vigente, deve-se permitir que a transparência na gestão pública se torne uma prática de gestão. Dessa forma, este trabalho visa compreender como os gestores públicos dos municípios integrantes do COREDE Missões, pertencente ao estado do Rio Grande do Sul (RS), percebem as práticas de gestão da transparência, qualificada a partir dos respectivos portais eletrônicos. A seleção desses municípios ocorreu a partir do estabelecimento do Índice de Transparência na Gestão Pública Municipal (ITGP-M), elaborado para dar subsídios a esta investigação. Para atender a esse objetivo, tem-se como pergunta norteadora do estudo: “Quais as práticas de gestão que qualificam as posições no ITGP-M das prefeituras municipais integrantes do COREDE Missões, na percepção de gestores públicos?”.

 Justifica-se a investigação dos municípios da área de abrangência do COREDE Missões pela sua importância regional, por planejar mecanismos de participação social, para coletivamente encaminhar demandas congregadas de municípios pequenos, mas que contribuem para o desenvolvimento do Estado do RS. Como arranjos institucionais, os Conselhos Regionais de Desenvolvimento (COREDEs) equivalem a espaços públicos, onde é possível a prática da cidadania deliberativa, que traz aos municípios maior autonomia, rompendo o desenho tradicional das políticas públicas, ao tempo que implementa políticas sociais, através de mecanismos de gestão democrática e participativa no âmbito local, em torno da discussão pública de questões específicas (Allebrandt, Siedenberg, Sausen & Deckert, 2011).

Cabe destacar que os COREDEs foram sendo estruturados a partir do ano de 1991, instituídos legalmente pela Lei Estadual n° 10.283, de 17 de outubro de 1994, e regulamentados através do Decreto n° 35.764, de 28 de dezembro de 1994. Esses COREDEs estão articulados em nove regiões funcionais de planejamento, conforme proposto pela Secretaria de Coordenação e Planejamento do Estado do RS (RS, 2005), preocupando-se com as desigualdades regionais no Estado. Dentre eles, o COREDE Missões é constituído por 25 municípios.

Assim, ao analisar a gestão pública em nível municipal, prioriza-se o espaço local; mesmo sabendo da importância das políticas macro, é em âmbito local que a vida flui, que as pessoas interagem e preocupam-se com os problemas que querem ver resolvidos, sendo fundamental valorizar este espaço para viabilizar a prática da cidadania, facilitar a vida social e o desenvolvimento local (Abreu, Leopoldino & Melo, 2008).

 Diante do exposto, a relevância da pesquisa está em possibilitar aos munícipes a oportunidade de conhecer melhor as práticas de gestão que evidenciam a transparência nesses municípios. Além disso, é direito do cidadão ter acesso às informações que permitam observar os rumos que seguem os recursos públicos destinados aos seus municípios, bem como saber se as informações exigidas pela legislação vigente estão sendo disponibilizadas. Ainda, busca-se contribuir para que os gestores públicos analisem a forma como evidenciam a divulgação de informações em suas gestões, possibilitando orientá-los no desenvolvimento de políticas de disponibilização de informações claras e eficientes, o que pode auxiliar no estreitamento da relação governo e cidadão.

Para a condução deste estudo, elencou-se o ITGP-M dos 25 municípios integrantes do COREDE Missões, para, então, realizar entrevistas semiestruturadas com 10 gestores públicos municipais, buscando compreender as práticas que qualificam as posições no ranking dos seus respectivos municípios. Para tanto, foi realizado um estudo qualitativo, do tipo exploratório, por meio do método indutivo.

As entrevistas foram analisadas com suporte da técnica de Análise de Conteúdo, a qual resultou na classificação de dez categorias: fluxo da informação; quantidade da informação; qualidade da informação; recursos humanos; infraestrutura; controle social; cultura organizacional; participação popular na gestão pública; interação governo x cidadão; e, accountability. 

 

2. PRÁTICAS DE TRANSPARÊNCIA NA GESTÃO PÚBLICA

A transparência torna-se um dos fragmentos da publicidade, garantida pela Lei Complementar nº 131/2009 - Lei da Transparência, que no art. 1º define que, entre outras ações, a transparência será assegurada mediante o encorajamento à participação popular (Brasil, 2009). Bezerra e Cavalcanti (2011) defendem que a publicidade das questões administrativas é tema central nos regimes democráticos contemporâneos e que informação é sinônimo de poder. Quem dispõe de informações oportunas alcança respeito, influência e melhores remunerações.

Reiterando, a transparência engloba mais do que o princípio da publicidade, previsto na Constituição Federal de 1988, pois traz a possibilidade da participação do cidadão na gestão pública, permitindo-lhe conhecer e intervir nos projetos, planos e ações públicas. Seu propósito é vedar ações imprevistas e impróprias por parte dos gestores, ampliando o acesso dos cidadãos às informações públicas, com a finalidade de construir um país mais democrático, propiciando à sociedade desempenhar o controle social (Souza, Santana, Cruz & Silva, 2009).

Assim, o foco da transparência está em minimizar a assimetria informacional entre os cidadãos e os gestores públicos, por meio de ações que exibem as atividades desses gestores. Há transparência na divulgação de uma informação quando esta é disponibilizada sem ressalvas, incluindo todos os elementos relevantes, compreensíveis, confiáveis, de qualidade e de forma que permita aos interessados darem contribuições a seu respeito (Loya, 2004).

O objetivo da transparência deve ser garantir ao cidadão, de forma individual, o acesso às informações que transmitam o desempenho dos governantes, explicitando as ações que estão em andamento, as executadas em períodos anteriores e as que estão em fase de planejamento. Isso deve ser realizado através de ampla divulgação, por meio eletrônico e de audiências públicas, onde devem ser disponibilizados os planos, diretrizes orçamentárias, orçamentos, relatórios periódicos da execução orçamentária e da gestão fiscal, bem como das prestações de contas e pareceres prévios emitidos pelos tribunais de contas (Silva, 2009 & Santos, 2017).

Em relação à publicação em meio eletrônico, a informação deve estar disponível a qualquer tempo, tendo em vista que governos transparentes não estão limitados apenas a disponibilização de informações referentes à suas gestões, mas também a deixar evidentes informações de gestões anteriores a sua, para que os cidadãos possam analisar os resultados e acompanhar a evolução da máquina pública. No que se refere à audiência pública, essa é um instrumento de participação popular e tem como finalidade a promoção do debate entre os atores sociais, a fim de envolvê-los na busca por soluções de questões que englobam o núcleo social a qual pertencem (César, 2011).

Além dessas, outra prática de gestão central nos regimes democráticos contemporâneos, que compete à transparência, é a capacitação de servidores. Para Gomes, Marques e Pinheiro (2016), é fundamental ponderar a capacitação como um importante fator de apoio à ruptura com padrões de sigilo na área pública, anteriores a Lei de Acesso à Informação (Lei 12.527/2011), e de apoio e incentivo à abertura e conscientização de que a informação pertence à população.

Porém, de nada adianta capacitar os servidores se não houver infraestrutura adequada para atendimento das demandas originadas em atenção à LAI. Araújo e Mello (2016) dissertam sobre a prevalência nos municípios brasileiros de uma “cultura do pen drive”, a qual não trata somente da cultura do sigilo, mas da prática da apropriação pessoal, por parte do servidor público, da informação sob seu gerenciamento.

Esse servidor não compartilha a informação nem sequer com os demais servidores, muito menos com o cidadão. Trata-se de uma cultura organizacional engessada (Carbone, 2000), com traços do patrimonialismo, ou seja, apropriação do público pelo privado. Nesse sentido, Martins (1997) destaca que a administração pública brasileira foi fundamentada com interferência do etos patrimonialista, herdado da cultura lusitana.

Dentre muitas, essas são algumas das práticas que caracterizam a transparência no setor público. Entende-se que esse horizonte é ainda mais amplo, e esse entendimento norteia a discussão dos resultados deste estudo, que visa elencar outras práticas adotadas pelas prefeituras investigadas.

 

3. METODOLOGIA

A pesquisa caracteriza-se como exploratória, de abordagem qualitativa, ancorada no método indutivo. Para tanto, foi realizada pesquisa de campo, por meio da realização de entrevistas semiestruturadas, com gestores públicos de dez municípios do noroeste do RS. A seleção ocorreu  a partir de um ranking de transparência dos municípios integrantes do COREDE Missões, de acordo com o ITGP-M, instrumento elaborado por Cruz (2010), objetivando compreender como os gestores públicos dos municípios integrantes do COREDE Missões-RS percebem as práticas de gestão da transparência, qualificada a partir dos respectivos portais eletrônicos.

 

 

O ITGP-M constitui-se em uma variável de natureza quantitativa, sendo o instrumento de coleta de dados organizado em seis categorias de informações que abrangem 119 variáveis, avaliando desde informações básicas até financeiras, fiscais, contábeis, quantitativas e qualitativas sobre a gestão. Sua pontuação pode variar de 0 a 143 pontos. Assim, a pontuação que cada prefeitura recebeu foi o somatório de cada uma das categorias (ITGP-M = C1 + C2 + C3 + C4 + C5 + C6).

Os itens contemplados no instrumento de coleta de dados foram analisados a partir de uma lógica binária, em que a sua existência na homepage levou à pontuação 1 (um), e a não existência à pontuação 0 (zero). Porém, como alguns itens da categoria 3 (C3) contemplam relatórios periódicos de publicação obrigatória pelas prefeituras, para esses demonstrativos a pontuação por sua disponibilização na homepage do município considera uma escala proporcional, que usa como referência a periodicidade máxima dos relatórios previstos pela LRF, que são maioria na categoria C3, pelo fato de o número máximo dos relatórios previstos da LRF ser equivalente a 10 anos e exigidos desde o ano de 2000 (Cruz, 2010). Assim, o parâmetro utilizado na avaliação da categoria 3 atribui 1 ponto para disponibilização de 1 a 3 anos; 2 pontos para 4 a 6 anos e 3 pontos para disponibilização de 7 a 10 anos.

Para estabelecimento do ranking de transparência, os dados foram coletados nos portais eletrônicos dos 25 municípios que integram o COREDE Missões. Para a coleta de informações foi desenvolvido um banco de dados com a utilização do Microsoft Excel, no qual as informações colhidas no período de outubro de 2016 a janeiro de 2017 foram registradas e armazenadas. Para identificação dos portais eletrônicos dos municípios foi utilizada a plataforma de busca online do Google (http://www.google.com.br), aderindo como termo padrão de busca “Prefeitura Municipal de (nome do município)”.

Para análise dos portais foram utilizadas cerca de 300 horas, sendo gasto em média 12 horas em cada portal eletrônico, pois para investigar se eram ou não disponibilizadas as 119 variáveis investigadas foram encontradas inúmeras dificuldades, como por exemplo: primeiramente, investigava-se se no portal existia mapa do site. Como na maioria dos municípios esse recurso não era disponibilizado, partia-se para o serviço de busca, quando este era disponibilizado. Não encontrando o serviço de busca, acessavam-se os links disponíveis na página principal, e, caso ainda não fosse encontrado o conteúdo procurado, acessava-se a plataforma de busca online do Google e digitava-se o que estava sendo procurado e o nome do município, como, por exemplo, “Código Tributário do município de (nome do município)”. Somente depois de descartadas todas as hipóteses consideravam-se como não disponibilizadas as informações pelo município. A Tabela 1 apresenta o resultado da pesquisa quanto ao Ranking dos Municípios de acordo com o ITGP-M.


 

 

 

 

 

 


 

 

Tabela 1 - Ranking dos Municípios de acordo com o ITGP-M

Município

ITGP-M

% de transparência

Classificação

São Luiz Gonzaga

76

53,1

São Miguel das Missões

74

51,7

São Paulo das Missões

71

49,6

Santo Ângelo

70

48,9

Giruá

66

46,1

Porto Xavier

61

42,6

Mato Queimado

61

42,6

Pirapó

58

40,5

Guarani das Missões

57

39,8

São Pedro do Butiá

57

39,8

10º

Entre-Ijuís

57

39,8

11º

Caibaté

52

36,3

12º

Ubiretama

52

36,3

13º

Eugênio de Castro

51

35,6

14º

Vitória das Missões

50

34,9

15º

Cerro Largo

50

34,9

16º

Bossoroca

49

34,2

17º

Rolador

48

33,5

18º

Sete de Setembro

46

32,1

19º

Salvador das Missões

46

32,1

20º

Roque Gonzales

46

32,1

21º

São Nicolau

44

30,7

22º

Garruchos

38

26,5

23º

Santo Antônio das Missões

37

25,8

24º

Dezesseis de Novembro

35

24,4

25º

Fonte: Dados da pesquisa (2017).

 

Com base na Tabela 1, pode-se inferir que “São Luiz Gonzaga” foi classificado como o município mais transparente da região em análise, obtendo um índice de 53% na avaliação de seu portal, isto é, 76 pontos do total do ITGP-M, enquanto “Dezesseis de Novembro” foi o município considerado com menor índice de transparência na divulgação de informações sobre sua gestão, alcançando um índice de 24%, ou seja, 35 pontos.

Desses municípios, foram selecionados para as entrevistas os gestores públicos (secretários municipais) dos cinco municípios classificados nas melhores posições do ranking (“top”) e dos cinco municípios classificados nas piores posições do ranking (“down”). Acredita-se que este critério de seleção possa subsidiar uma análise da percepção da transparência na região de estudo.

A análise dos dados seguiu um processo indutivo (Lakatos & Marconi, 2011). Os dados obtidos através das entrevistas foram transcritos e o material foi identificado por códigos, por meio da análise de conteúdo. Para Bardin (2004), a análise de conteúdo organiza-se em três fases: pré-análise; exploração do material; e tratamento dos resultados, inferência e interpretação. Na pré-análise foi realizada uma releitura de todo o material coletado, a fim de operacionalizar a interpretação dos resultados. Explorando os materiais, foi realizada a descrição analítica dos dados, para representar o seu conteúdo.Já na fase da inferência e interpretação, os dados coletados foram confrontados com a literatura, com a finalidade de aprofundar o estudo e conhecer o conteúdo que eles possuem (ideologias, tendências, etc.).

As entrevistas foram realizadas nos meses de abril a junho de 2017, de forma presencial, nas prefeituras dos municípios selecionados, com duração média de 30 minutos cada. Os participantes foram abordados pela pesquisadora, valendo-se de um roteiro semiestruturado.  A saturação dos dados ocorreu após a realização das primeiras interlocuções, e mesmo assim, optou-se por manter todas as entrevistas previstas na metodologia do estudo, obedecendo na análise desses dados, as regras da exaustividade, representatividade, homogeneidade e pertinência (Bardin, 2004).

 

4. ANÁLISE DE RESULTADOS

Realizaram-se dez entrevistas que, abordando a mesma temática, foram empreendidas com o objetivo de compreender como os gestores públicos têm atuado na disponibilização de informações em portais eletrônicos de prefeituras municipais, a partir da Lei de Acesso à Informação.

Para preservar a identidade dos gestores que participaram da pesquisa, considerando que eles manifestaram opiniões baseadas em suas próprias experiências, seus nomes foram omitidos, sendo caracterizados como T1, T2, T3, T4 e T5 os considerados “top” e D6, D7, D8, D9 e D10 os “down”. O Quadro 1 qualifica os entrevistados.


 

Quadro 1 - Perfil dos gestores entrevistados

Respondente

Cargo

Experiência na gestão pública

T1

Secretário Municipal da Administração e Desenvolvimento

Funcionário público municipal desde julho de 2002, com 15 anos de experiência no serviço público. Graduado em Direito e advogado atuante desde 2009.

T2

Secretário da Administração

Na gestão pública desde o ano de 1993, inclusive exercendo o cargo de Prefeito por dois mandatos. Possui formação em Contabilidade.

T3

Secretário Geral de Gestão Pública até a semana anterior a realização da entrevista. Vereador e Servidor Público do Poder Legislativo.

Possui formação em Economia. Ingressou no setor público no ano de 2006 como estagiário. Vinculado aos serviços de acesso à informação desde o final de 2013.

T4

Secretário Geral de Governo

Graduado em Direito e pós-graduado em Direito Público. Na gestão pública exerce cargo de confiança desde janeiro de 2017.

T5

Secretária de Gestão Financeira e Suprimentos

Bacharel em Administração, pós-graduada em Educação, Cultura e Cidadania - ênfase em Gestão e Mestre em Educação nas Ciências - Administração. Na gestão pública exerce cargo de confiança desde janeiro de 2017.

D6

Secretário Municipal da Fazenda

Exerce cargo de confiança desde janeiro de 2017.

D7

Secretário Municipal da Fazenda

Iniciou sua trajetória na gestão pública no ano de 1978. Cargo de confiança na função de Secretário da Fazenda desde maio de 2017.

D8

Secretário Municipal da Fazenda

 

Atua na gestão pública há 15 anos, sendo servidor efetivo. Atualmente exercendo cargo de confiança.

D9

Secretário Municipal da Fazenda

Atua na gestão pública desde 2013.

D10

Vice-Prefeito

Possui 12 anos de experiência na gestão pública. Vereador em duas legislaturas e vice-prefeito em dois mandatos.

Fonte: Dados da pesquisa (2017).


A fim de aplicar a técnica de análise de conteúdo, buscou-se, a partir da realização das entrevistas, categorizar as práticas que materializam a transparência na gestão pública, na concepção dos entrevistados. No Quadro 2 apresenta-se um esquema que destaca as categorias identificadas, a suas definições originárias da literatura, bem como as subcategorias advindas desta análise.


 

Quadro 2 - Categorias classificadas a partir das práticas identificadas pelos gestores públicos municipais, que materializam a transparência evidenciada em portais eletrônicos de municípios do COREDE Missões

Categorias identificadas a partir das entrevistas

Definição

Significado utilizado (subcategorias)

1

Fluxo da Informação

Movimentação dos dados dentro da instituição (prefeitura) até sua publicização no portal eletrônico.

Assessoria de Imprensa

Terceirização da administração do portal eletrônico

2

Quantidade de Informação

A informação em excesso dificulta a pesquisa, torna difícil tomar conhecimento daquilo que ocorre na esfera pública.  É necessário evitar excesso e/ou falta de informação (Batista, 2010)

Suficiente

Insuficiente

3

Qualidade da Informação

A qualidade da informação pode ser identificada pela disponibilidade, veracidade, integridade e primariedade (LAI, 2011).

Compreensível

De fácil acesso

Atualizada

4

Recursos Humanos

(Servidores)

Servidores municipais responsáveis pelos atendimentos de demandas de acesso à informação.

Capacitação

Rotatividade de pessoal

5

Infraestrutura

Trata da estrutura disponibilizada para atendimento a Lei de Acesso à Informação (LAI, 2011).

 

Vinculação ao Setor de Protocolos

Falta de recursos (financeiros, informacionais e humanos)

Falta de setor específico para atendimento a LAI

6

Controle Social

Fiscalização da gestão do Estado por parte dos cidadãos, que usufruindo do direito de participação e controle garantido pela CF, reivindicam a prestação de contas do governo sobre a utilização dos recursos públicos e da destinação destes recursos ao atendimento de demandas da sociedade (Abdala & Torres, 2016).

Controle por parte dos cidadãos

 Publicização de informações “particulares”

 

 

7

Cultura Organizacional

Conjunto de normas e leis compartilhadas pelos membros de uma determinada organização; conjunto de crenças, hábitos, valores, atitudes, tradições entre os grupos existentes em todas as organizações (Newstrom, 2008).

Cultura da transparência

Cultura do sigilo

 

8

Participação popular na Gestão Pública

Participação dos cidadãos na gestão pública, da forma como eles interagem quando são convocados a participar, em especial por meio das audiências públicas.

População atuante

Pouca participação da população

9

Interação Governo x Cidadão

Forma como ocorre a interação entre governo e cidadão, por intermédio do portal eletrônico dos municípios investigados.

 

Governo eletrônico

Ouvidoria

10

Accountability

Como os gestores públicos dos municípios investigados percebem a manifestação da transparência em suas gestões.

Controle externo (legislativo, judicial, social, TCE)

Prestação de contas (accountability)

Fonte: Dados da Pesquisa (2017).                          

                  


Para a análise dos resultados, optou-se por discutir cada uma das categorias individualmente.

 

4.1. Análise da Categoria 1: Fluxo da Informação

A categoria 1, Fluxo da Informação, trata da movimentação dos dados dentro das prefeituras municipais, até a sua disponibilização ao cidadão nos portais eletrônicos institucionais. Para Dowbor e Silva (2006, p. 11), a informação pública “é uma construção social, e depende dos atores que a produzem, divulgam e utilizam”. A expansão do alcance e da fluidez da informação pública demanda mudanças, “tanto de ordem técnico-procedimental como político-administrativa” (INDOLFO, 2013, p. 21). Nesse sentido, de Miranda Guedes (2014) argumenta que a prerrogativa legal do acesso à informação pública de posse do Estado requer intervenções de gestão informacional e documental nas instituições públicas que exigem a perícia, o conhecimento e a habilidade do profissional da informação.

Identificou-se que nos municípios com melhor desempenho (top 5) o fluxo da informação passa pela Assessoria de Imprensa, conforme relatado: “o assessor de imprensa semanalmente está postando dados, inserindo dados no nosso portal, no nosso site, ele que faz esse gerenciamento” (D10). “A atualização é feita através dos nossos assessores de imprensa...” (T4).

Por outro lado, foi constatado que nos municípios com menor índice de transparência (down 5) há uma terceirização na administração do portal eletrônico: “temos uma pessoa que faz o contato com a empresa que gerencia o portal. Não conseguimos uma maneira de ter o acesso direto. Nós temos um funcionário para quem a gente passa os dados e ele é o responsável por enviar as informações pra empresa” (D9).

Muitos gestores falaram sobre essas empresas, referindo-se às questões da contabilidade e dos relatórios de gestão fiscal, de atualização diária: “porque municípios hoje teriam imensa dificuldade se não tivesse a questão informatização [...] hoje existem inúmeras empresas que disponibilizam o software de gestão pública”. (T3)

O que se percebe é que a terceirização desses serviços e a utilização de softwares de gestão pública têm ocasionado mudanças organizacionais, nem sempre fáceis de serem assimiladas, tanto pelos servidores, quanto pelos gestores. Quanto a isso, Bergue e Klering (2010) asseveram que o processo de apropriação de tecnologias gerenciais deve acontecer a partir de uma abordagem dialética, em que ocorra a desconstrução e ressignificação de seus conceitos e pressupostos básicos, com a finalidade de gerar tecnologias que possam ser melhor assimiladas pela organização.

 

4.2. Análise da Categoria 2: Quantidade de Informação

A informação em excesso dificulta a pesquisa, torna difícil tomar conhecimento daquilo que ocorre na esfera pública. Para Batista (2010), é necessário evitar excesso e/ou falta de informação. O Estado precisa disponibilizar documentos melhor estruturados e com mais clareza: linguagem acessível à população, tutoriais de utilização e campanhas de esclarecimento.

Alguns gestores dos municípios mais bem qualificados (top 5) indicaram algumas das informações que disponibilizam nos seus sites: “informações sobre os ocupantes de cargos públicos, a estrutura administrativa do município e toda legislação municipal está no portal” (T1); “as informações quanto ao cargo, quanto a salário, remuneração, são disponibilizadas [...] se você pesquisar a quantidade de professores, encontrará o cargo de cada um, nome, a remuneração mensal...” (T3). Estas narrações pressupõem que as informações básicas sobre a gestão pública estão sendo disponibilizadas.

Entretanto, para os municípios menos qualificados no ranking (down 5), a negativa da existência destas informações evidencia a insuficiência de dados disponíveis para acesso. D8 indica que percebe esta insuficiência: “Acho que não, certamente não [há quantidade suficiente de informações]. A administração toda é nova, quer dizer, os atuais administradores não tinham experiências anteriores”. Este gestor referia-se à inexistência no portal eletrônico de informações básicas sobre os ocupantes de cargos públicos e a estrutura administrativa do município, bem como da legislação e dos instrumentos de planejamento municipal.

Dessa forma, verifica-se que as respostas corroboram com o ranking da transparência estabelecido, ilustrando a posição dos municípios representados por esses gestores, sendo que os melhores colocados têm disponibilizado as informações consideradas básicas sobre sua gestão.

 

4.3. Análise da Categoria 3: Qualidade da Informação

Conforme a Lei 12.527 (Brasil, 2011), a qualidade da informação pode ser identificada pela disponibilidade, veracidade, integridade e primariedade. O atendimento a esses padrões pode assegurar que a informação seja disponibilizada de forma compreensível, correta, transparente, confiável e segura, atendendo às demandas do cidadão.

Na identificação desta categoria, algumas narrativas chamaram a atenção, destacando-se a de T3.

Eu me refiro a você acessar o portal e acompanhar o orçamento das despesas, o orçamento por elemento de despesa. O próprio linguajar a população tem dificuldade de entender. Por exemplo, empenho, a população não compreende e o site traz dessa forma. O portal traz isso, números de empenho, empenho por fornecedor, despesas por fornecedor. Então, eu acredito que, claro essa lei é muito nova, a lei não vou dizer que é muito nova, mas a prática por parte dos municípios é muito nova, então, eu acredito que a cultura vai evoluindo com o passar do tempo e isso vai, o povo vai começar a perceber a importância de acompanhar. (T3)

 

T3 também abordou a questão da apresentação das informações contábeis em linguagem técnica, de difícil compreensão. Mesmo que os municípios divulguem informações quantitativas sobre a gestão e que elas possuam nomenclatura técnica, fazendo com que grande parte da sociedade não compreenda o que está sendo publicado, Platt Neto, Cruz, Ensslin e Ensslin (2007) enfatizam que a transparência na divulgação dessas informações não pode ser comprometida, sendo necessárias ações para promover a compreensibilidade dos dados. Esses autores definem três dimensões que contextualizam a transparência na divulgação de informações: publicidade, compreensibilidade e sua utilidade para decisões. A dimensão da compreensibilidade estaria, neste caso, relacionada à apresentação visual dos dados, incluindo sua formatação (relatórios, demonstrativos, balanços, pareceres, prestação de contas, dentre outros), ao uso da linguagem, objetivando idealizar a clareza, a linguagem acessível e focada ao perfil dos usuários (cidadãos), no sentido de possibilitar o entendimento das informações.

Outras questões levantadas pelos entrevistados estão relacionadas à qualidade da informação e referem-se à facilidade de acesso, informações atuais e à própria atualização dos dados.

Muitas vezes a população quer saber onde está o plano plurianual, mas não sabe que o plano plurianual é estabelecido por lei e não vai procurar nas leis [...] ele quer saber onde que está o plano plurianual [...] e ele não localiza o PPA, então, foi disponibilizado um link específico para o plano plurianual, além de estar disponível também nas leis, para ficar de forma mais clara. (T3)

 

No mesmo sentido, D9 afirmou: “o portal tem que ser [...] limpo, tu tem que entrar lá e encontrar o que tu procura”. Nota-se uma concordância entre os entrevistados, que a qualidade da informação é fundamental para a promoção da transparência na gestão pública e que deve ser tratada  como  um  produto  que  demanda  formatação,  análise,  atualização  e  melhoramento constante, a fim de atender às necessidades dos cidadãos. 

 

4.4. Análise da Categoria 4: Recursos Humanos (Servidores)

Por meio das  entrevistas foi possível verificar a importância da capacitação de servidores para a transparência: “eles vão uma vez por ano fazer um curso de aperfeiçoamento para que o município continue bem enquadrado na questão de portal da transparência”. (T1); “a gente participou de treinamentos por parte da empresa e do Tribunal, os diversos setores da administração participaram [...] e aí a gente passava as coisas para os demais órgãos e secretarias” (T3); “a nossa secretária da administração buscou uma capacitação para todos nós” (D10).

Essas evidências confirmam a necessidade de capacitação para o desenvolvimento de tarefas, e a importância da qualificação de recursos humanos para atendimento ao cidadão, tendo em vista que são os servidores que têm contato direto com a sociedade e representam o governo nessa relação. Percebe-se que nos municípios com melhores pontuações no ranking da transparência a qualificação dos servidores públicos tem sido tratada como um meio de impulsionar o desenvolvimento de suas habilidades, visando o melhor atendimento à população, o que é fundamental para a obtenção dos objetivos organizacionais e, neste caso, para a efetivação da LAI. Gomes, Marques e Pinheiro (2016) sinalizam a importância de considerar a capacitação de servidores como ingrediente de apoio à ruptura com padrões de sigilo nas instituições públicas brasileiras.

Também foi identificado que há rotatividade de pessoal, o que pode prejudicar a publicização das informações no site da prefeitura.

Quando é um município maior tem um setor disponível pra isso, município pequeno é difícil [...] a gente pode exemplificar por nós. Tivemos períodos que tínhamos profissionais responsáveis pela comunicação e pelo assessoramento de imprensa. As informações estavam toda hora no site, esse profissional saiu e a gente ficou um tempo sem conseguir outra pessoa pra fazer isso. (T2)

 

No que se refere à rotatividade de pessoal, esse fator foi identificado como negativo, vindo a prejudicar na pontuação do ranking, pois, como observado no discurso do entrevistado T2, sempre que ocorre a troca do servidor responsável por disponibilizar as informações de acesso ao público há uma demora na substituição e na própria capacitação deste para atendimento da demanda.

Esta rotatividade é ocasionada pelo fato de os profissionais destinados a setores como assessoria de imprensa, chefia de gabinete e comunicação, os quais são também os responsáveis pelo atendimento às demandas da LAI, serem cargos de confiança do executivo municipal. Para Graef (2008), o grande número de cargos de confiança na gestão pública, de modo inevitável favorece a grupos de interesse e constitui-se em fator favorável à corrupção, além de causar ineficiência administrativa, ao passo que desmantela o funcionamento dos órgãos, causando descontinuidade e falta de eficácia. Santos (2009) argumenta no mesmo sentido, enfatizando que os cargos se transformaram em moedas de troca na disputa por apoio político e que, mesmo que haja algumas tentativas de ‘enxugamento’, em que regras limitadoras do seu exercício foram fixadas, a prática continua existindo.

Graef (2008) e Santos (2009) corroboram com o que foi identificado nesta categoria de análise, pois a descontinuidade dos serviços e a falta de profissionais do quadro permanente, com o perfil necessário para certas atividades influenciam o desempenho da gestão pública municipal, neste caso, prejudicando na transparência evidenciada em seus portais eletrônicos.

 

4.5. Análise da Categoria 5: Infraestrutura

Apurou-se nas entrevistas que, nos municípios com melhores índices de transparência, as demandas de acesso à informação estão vinculadas ao setor de protocolo. Ao ser questionado sobre a possibilidade de o cidadão fazer um pedido de acesso de forma presencial, D9 informou como local “no protocolo”. Outros relatos que declararam a vinculação referem-se a T1 e D6: “Ele vai direto ao protocolo. No protocolo geram um número de processo para acompanhamento da solicitação. Claro que a resposta vai ir para o local que ele informar que tem que ir” (T1). “A gente recebe bastante pedido, eles fazem o protocolo e o pedido é distribuído para o setor competente, depois o munícipe recebe a informação” (D6).

Porém, foi identificado nos diálogos que, em termos de infraestrutura, faltam recursos financeiros, informacionais e humanos: “A maior dificuldade que a gente tem é a grande demanda de serviços e a precariedade dos recursos […] cada vez vem mais serviço para o município e menos recursos para investir em pessoal, em equipamentos” (D6).

É consenso entre os gestores, também, que falta um setor específico para atendimento à LAI: “não existe um órgão na administração, um local, um espaço onde o cidadão pode se deslocar [...] eu preciso de tal informação, isso não existe” (T3); “existe uma dificuldade nos municípios, principalmente nos municípios menores onde as dificuldades para disponibilizar informações são grandes, devido à falta de estrutura, o que atrapalha um pouco. Quando é um município maior, normalmente tem um setor disponível pra isso” (T2).

Nota-se, nos discursos, que os municípios avaliados encontram dificuldades para se adequar às exigências da Lei 12.527/2011, em termos de infraestrutura. A referida lei garante, em seu art. 9º, que o acesso à informação pública será assegurado mediante a criação de serviço de informações ao cidadão, em local com condições apropriadas para: atender e orientar o público quanto ao acesso às informações; orientar sobre a tramitação de documentos nas suas respectivas unidades; e protocolizar documentos e requerimentos de acesso a informações (Brasil, 2011). Alguns municípios têm superado essas dificuldades vinculando as demandas ao setor de protocolo, enquanto outros enfatizam a falta de recursos e o repasse cada vez maior de responsabilidades à esfera municipal.

 

4.6. Análise da Categoria 6: Controle Social

Para Abdala e Torres (2016, p. 151) “o controle social sobre a administração é a categoria que visa identificar se os portais investigados cumprem, pelo menos em parte, com o que é exigido pela Constituição e pela Lei de Responsabilidade Fiscal”. Para esses autores, os gestores públicos devem ser fiscalizados por aqueles que neles confiaram, garantindo que não coloquem suas ambições e interesses acima do bem comum, evitando corrupção e o uso indevido da máquina pública.

Identificou-se, nas entrevistas com os gestores públicos, que os municípios com melhores pontuações no ranking de transparência têm dado atenção ao controle por parte dos cidadãos. Cidadãos esses que, amparados pela legislação, participam da esfera pública, individualmente ou organizados em movimentos populares, pressionando a gestão pública a atuar de forma mais transparente. Tal evidência é amparada por relatos, tais como o de T3 e T1: “não é uma vontade do administrador, é uma questão que a lei de acesso à informação e a lei da transparência lhe obrigam a fazer. Não é um querer ou não querer” (T3); “tem os links e toda a informação é retornada ao cidadão que, em tese, fez alguma reclamação ou algum elogio da administração [...] é retornado pra que ele tenha ciência também do que está acontecendo”. (T1). Essas considerações indicam que o controle social tende a reforçar o comprometimento da gestão pública com a transparência, o que pode fortalecer as relações democráticas.

Nota-se também que há certa cautela por parte dos gestores em relação à publicização e acompanhamento pelos cidadãos de informações consideradas de cunho particular, como os salários, por exemplo.

Algumas informações o pessoal diz que podem gerar problemas, por exemplo, divulgar os salários dos servidores, [...] tem órgãos que não divulgam. Eu acho que é importante. É público, é público. Não tem porque as pessoas não disponibilizarem. Então, claro que tem coisas que às vezes podem trazer algum problema, mas eu acho que seguindo a lei, [...] algumas informações a lei restringe, aquilo que a lei permite e é ligado ao setor público, na minha opinião, tem que ser divulgado […] muitas vezes as coisas acontecem de forma errada por falta de transparência. (T2)

 

Nota-se nessa fala, realizada por um gestor de um dos municípios considerados “top” que há certa resistência dos servidores públicos municipais pela divulgação de algumas informações, que são caracterizadas como de cunho pessoal. Esta reação já foi discutida por Burgarelli (2015), o qual descreve a relutância do funcionalismo e da burocracia interna da Câmara de Vereadores de São Paulo (SP) à divulgação dos seus salários. Entretanto, o que se pode notar, é que mesmo com este tipo de oposição por parte dos servidores, o município ao qual pertence o gestor T2 publica estas informações e busca o cumprimento da LAI, o que pode estar refletindo na sua melhor colocação no ranking da transparência realizado neste estudo.

Tal ação vai de encontro à postura da gestão da prefeitura municipal em que atua o entrevistado D10, o qual relata que “[...] a gente apenas divulga (no site) trabalhos em que o controle interno [...] orienta, alguma meta ou um trabalho específico, ou para evitar algum problema [...]”. Percebe-se, nesse discurso, que no município integrante do grupo down 5, majoritariamente, as informações divulgadas são aquelas indicadas pelo controle interno da instituição, expostas quase que obrigatoriamente para atender a alguma demanda legal ou solicitação social. Esse é o diferencial percebido entre as posturas das gestões dos municípios top e down investigados, sendo que nos primeiros há a valorização e a atenção das informações divulgadas aos cidadãos, mesmo as de cunho mais ‘particular’, enquanto que nos demais percebe-se a disponibilização da informação como uma ação impositiva, exclusivamente para atendimento da demanda legal ou social.

Importante ressaltar que a informação pública que gere conhecimento ao cidadão deve ser divulgada, entendendo-se que a publicidade e a acessibilidade às informações são requisitos básicos para o desenvolvimento da democracia. Vaz (2006) argumenta que a pressão da sociedade por participação, transparência e controle social sobre as ações dos agentes públicos constituiu-se em uma das forças direcionadoras das transformações que têm ocorrido a partir da redemocratização da década de 1980, evoluindo o serviço público brasileiro. Dessa forma, a centralidade que estava nos movimentos populares vai sendo sucedida pela capacidade de articulação com outros atores, visando à construção de políticas públicas.

 

4.7. Análise da Categoria 7: Cultura Organizacional

Entendida como um conjunto de normas e leis compartilhadas pelos membros de uma determinada organização, a categoria cultura organizacional compreende o conjunto de crenças, hábitos, valores, atitudes e tradições observadas no decorrer da realização das entrevistas com os gestores públicos dos municípios e que refletem sua cultura organizacional (Newstrom, 2008) e sua observação está embasada nas subcategorias “cultura da transparência e cultura do sigilo”, de acordo com o Quadro 3.

Nos relatos, percebe-se que em alguns municípios já tem ocorrido mudanças organizacionais que impactam positivamente na questão da transparência: “é a clareza de informações para a população, tudo que faz [...] o gestor público, ele administra recurso que é público, então é de todos”. (D10)

Nós aqui, o que dá o pessoal vai colocando no site e as publicações que são obrigatórias por lei, da área tributária, de contabilidade, do setor de pessoal, isso está tudo no portal, disponível, mas resumindo, acho que a transparência precisa e deve existir. (T2)

 

A cultura da transparência é o objetivo da LAI. Sobre este assunto, Alves (2012) adverte que as transformações culturais devem decorrer de uma construção e não de uma obrigação, e sua legitimidade deve decorrer do reconhecimento que a sociedade imputa aos ritos por ela observados. Para a autora, está aí a explicação do porquê de algumas leis não terem aplicabilidade no Brasil, visto que a falha ocorre no legislativo, que acredita que com a publicação de uma lei automaticamente ocorrerá uma mudança de comportamento.

Por outro lado, percebe-se também que ainda prevalece uma cultura de sigilo, o que se contrapõe à cultura de transparência, conforme relatos: “há certa resistência para disponibilizar as informações [...] o gestor acaba abrindo os dados porque tem uma lei que o obriga a fazer isto [...] deveria ser ao contrário”, (D9); “nosso município não está nem 10%, talvez 20% do que a gente almeja, e é uma das metas principais que a gente tem aqui no nosso município, de tornar o portal da transparência eficaz, o que não está acontecendo” (D7).

Como uma política pública de transparência, a Lei nº 12.527/2011 veio demarcar a proposição de alteração da cultura de sigilo na administração pública brasileira para a cultura do acesso, o que tem imposto mudanças organizacionais que levam à alteração na elaboração de documentos sigilosos para documentos de ampla divulgação. Segundo a LAI, tem-se no ordenamento jurídico que o acesso à informação pública torna-se a regra, e o sigilo a exceção, estabelecendo-se mecanismos de acesso com efetividade, garantias aos cidadãos e hipóteses restritas de sigilo (Brasil, 2011).

 

4.8. Análise da Categoria 8: Participação popular na Gestão Pública

De acordo com César (2011), a audiência pública constitui-se em uma ferramenta de participação popular e legitimação das atividades do governo, sendo utilizada para a promoção de diálogo entre os atores sociais, com a finalidade de buscar caminhos para a resolução de problemas de interesse coletivo, além de servir como espaço para a apresentação de propostas, críticas e demais informações sobre o tema que estiver em pauta.

 A situação dos municípios investigados difere, uma vez que enquanto uns gestores relatam sobre uma população atuante (por exemplo: D9 e D10), outros reclamam da falta de participação (por exemplo: D7, T3, D6 e T1): “Muito pequena! A participação que a gente tem é dos entes envolvidos, dos servidores; da população é muito pequena”. (D7)

No nosso município a população é bem atuante, também nós como gestores fazemos reuniões descentralizadas, criamos o gabinete móvel, descentralizamos o atendimento à população. Nós vamos até o interior, buscamos programas de rádios, prestamos conta dos serviços prestados pela administração, dos recursos que foram aplicados e dos maiores parcelamentos que se paga […] aqui a população é bem participativa. (D10)

 

Segundo os relatos, percebe-se que os municípios com população atuante têm adotado como alternativa para motivar a participação: a divulgação da realização de audiências públicas, por meio dos agentes de saúde; a utilização das redes sociais; realização de reuniões descentralizadas e criação de gabinete móvel. Esses municípios têm atendido o que preconiza o art. 9º, inciso II, da LAI, o qual prevê que o acesso à informação será assegurado também mediante a realização de audiências públicas, incentivo à participação popular ou outras formas de divulgação (Brasil, 2011). Nesse sentido, Paes (2012) atenta para a instituição do Estado Democrático de Direito e o surgimento da concepção do poder emanar do povo, sendo que a partir desta ideia passou-se a incentivar a participação popular no controle das atividades do governo.

 

4.9. Análise da Categoria 9: Interação Governo X Cidadão

Esta categoria dialoga com a forma como ocorre a interação entre governo e cidadão, por intermédio do portal eletrônico dos municípios investigados, e sua observação baseia-se nas subcategorias “governo eletrônico e ouvidoria”.

Constatou-se que todos os municípios, independente da classificação no ranking de transparência, têm aderido ao governo eletrônico para melhorar a relação Governo x Cidadão, disponibilizando como principal canal de interação a Ouvidoria, conforme relatos: “temos a ouvidoria, que o cidadão acessa e faz a sua sugestão, a sua crítica” (D10); “no portal tem um local onde a pessoa pode fazer reclamação, denúncia, sugestões, enfim, a gente recebe”. (T2); “a gente tem uma ouvidoria, não é pra áreas específicas, mas a gente tem uma ouvidoria geral para todas as sugestões, reclamações, pedidos, informações”. (D7)

De acordo com os relatos, pode-se identificar que os municípios têm utilizado as TICs na gestão pública, as quais têm possibilitado avanços na transparência, com papel fundamental no processamento e disponibilização de informações (Bertot, Jaeger, & Grimes, 2010; Harrison & Sayogo, 2014), neste caso utilizando a Ouvidoria como canal de relacionamento, viabilizando a e-participação.

 

4.10. Análise da Categoria 10: Accountability

Conforme os relatos, além da imposição legal oriunda da legislação vigente, o controle externo tem exigido maior prestação de contas por parte da gestão pública:“o que a gente vê mais são denúncias feitas direto no portal do Tribunal de Contas do Estado, bem mais do que no do município” (T1); “a gente está fazendo uma prestação de contas bimestral, no prédio aqui da prefeitura, [...]a gente não levou ainda para o portal” (D7); “a legislação todo tempo muda e não é só a legislação federal, mas é uma legislação do Tribunal de Contas que é emitida através de Resoluções e Instruções Normativas, é bem complexo”. (T3)

Esses achados corroboram com o que preconiza Trosa (2001), ao afirmar que a crise de legitimidade do Estado favorece a transparência, uma vez que as administrações optam por prestar contas no lugar de se verem atacadas recorrentemente. A pressão e fiscalização por maior prestação de contas por parte dos agentes públicos pode surgir do poder político, dos servidores, do orçamento. Entende-se, daí, que a exigência de prestação de contas por parte de quem desempenha funções públicas pode originar-se de diversos atores da sociedade, incumbindo aos gestores que almejam legitimar os seus atos, demonstrar o seu trabalho de forma transparente e de modo que os interessados possam compreender, colaborando desta forma para a consolidação da democracia.

Os gestores entrevistados têm percebido que “a transparência é importante para que o cidadão consiga identificar onde está sendo gasto o seu dinheiro, o nosso dinheiro” (T1).

É uma ferramenta de muita utilidade para quem vai consultar as coisas, ele vai saber como está indo à administração do seu município, e ter acesso até para dar opiniões e sugestões para melhorar algumas coisas, porque é importante na administração pública ser transparente, sem a transparência nada vai dar certo. (D8)

 

O Quadro 3 apresenta, de forma resumida, os resultados do estudo, permitindo visualizar as práticas adotadas pelos gestores dos municípios classificados como “top” e como “down” no ranking da transparência, de acordo com o ITGP-M.

 

Quadro 3 - Práticas adotadas pelos gestores dos municípios classificados como “top” e dos classificados como “down” no ranking da transparência de acordo com o ITGP-M

Categorias identificadas a partir das entrevistas

Resultados

top

down

1

Fluxo da Informação

Assessoria de Imprensa

Terceirização na administração do portal eletrônico

2

Quantidade de Informação

Suficiente

 

Insuficiente

3

Qualidade da Informação

Há concordância entre os entrevistados, que a qualidade da informação é fundamental para a promoção da transparência na gestão pública e que deve ser tratada como um produto que demanda formatação, análise, atualização e melhoramento constante a fim de atender às necessidades dos cidadãos.

4

Recursos Humanos (Servidores)

Qualificação dos servidores

Rotatividade de pessoal

 

5

Infraestrutura

Vinculação ao setor de protocolos

Falta de recursos (financeiros, informacionais e humanos)

6

Controle Social

Atenção e valorização ao controle realizado por parte dos cidadãos

Disponibilização da informação como uma ação impositiva, exclusivamente para atendimento da demanda legal ou social

7

Cultura Organizacional

Cultura da transparência

Cultura do sigilo

8

Participação popular na Gestão Pública

Pouca participação da população

 

População atuante

9

Interação Governo x Cidadão

Todos os municípios, independente da classificação no ranking de transparência, têm aderido ao governo eletrônico para melhorar a relação governo-cidadão, disponibilizando como principal canal de interação a Ouvidoria.

10

Accountability

 

É consenso que a transparência abrange mais que a simples publicidade dos atos da gestão pública nos veículos oficiais de imprensa, impondo aos gestores a responsabilidade ética de prestação de contas.

Fonte: Dados da pesquisa (2017).

 

Essas práticas de gestão contribuem no atendimento às demandas por acesso à informação, desde a formalização do pedido até a disponibilização ao cidadão, porém, ainda há um longo caminho a ser percorrido para que a LAI se efetive na região em análise como uma política pública de transparência e accountability.

 

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Uma gestão pública transparente concede ao cidadão, a possibilidade de participar e controlar as ações da administração pública (Figueiredo, 2013). A transparência não se limita à disponibilização de certas informações, mas à possibilidade de acesso e compreensão de todas as informações relacionadas ao andamento das atividades da gestão pública por parte do cidadão. A publicização deve ocorrer de forma completa, relevante, oportuna, pertinente e confiável (Grau, 2005).

Esse propósito alinha-se como motivador desta investigação, que buscou compreender como os gestores públicos percebem as práticas de gestão da transparência, evidenciadas nos portais eletrônicos dos municípios da região de abrangência do COREDE Missões-RS. Para tanto, inicialmente, elencou-se o ITGP-M dos 25 municípios integrantes do COREDE Missões para, então, realizar entrevistas semiestruturadas com gestores públicos dos municípios classificados nas cinco melhores e nas cinco piores posições desse ranking.

Os resultados obtidos indicam que, por mais que já tenham ocorridos alguns avanços, ainda há um longo caminho a ser percorrido para que a transparência seja tratada como uma questão de prioridade pela gestão pública nos municípios em análise. A divulgação das informações e dados sobre a gestão pública não está totalmente em conformidade com a legislação, e há pouco incentivo – e algumas vezes até certa resistência - à participação do cidadão nos processos de planejamento, acompanhamento e avaliação das ações do governo, principalmente nos municípios de menor ranking no ITGP-M, o que não contribui para o controle social.

Ainda que os municípios investigados disponibilizem os dados quantitativos sobre a gestão, esses dados possuem nomenclatura e estrutura técnica, o que faz com que a maior parte da sociedade não compreenda o que está sendo publicado. Nesse sentido, Platt Neto et al. (2007) argumentam que a transparência na divulgação das informações não pode ser comprometida, sendo necessárias ações para promover a compreensibilidade dos dados.

A etapa qualitativa do estudo corrobora com o indicado no ranking elaborado a partir do ITGP-M, demonstrando que na região de abrangência do COREDE Missões os níveis de transparência são considerados baixos. O que se pôde verificar é que as principais práticas de gestão que qualificam positivamente as posições no ITGP-M das prefeituras municipais investigadas, na percepção de seus gestores públicos, são relacionadas à adaptação da infraestrutura com vistas ao incremento no fluxo e na quantidade da informação. Os municípios “top” organizam o Sistema de Informação ao Cidadão a partir da infraestrutura existente, adequando o setor de protocolo e, na maioria, utilizando a assessoria de imprensa para o processamento da informação.

Há também que ser ressaltada a qualificação da mão de obra, a cultura organizacional e a participação popular na gestão. Nesses municípios (top) tem sido oportunizado aos servidores qualificação constante e incentivado a participação popular mediante as práticas que aproximam a gestão dos cidadãos, observando-se mudanças na cultura organizacional. Esses gestores, a partir dos seus relatos, indicam que têm buscado se adequar ao novo cenário, no qual o sigilo passa a ser a exceção e a cultura do acesso, a regra.

Na outra ponta do ranking, as práticas referenciadas pelos gestores dos municípios piores avaliados indicam que a informação se perde no caminho (entre o servidor e a empresa terceirizada), ou chega desatualizada para a publicização devido à falta de infraestrutura e a dificuldade de organização interna da instituição. Nessas prefeituras, os gestores mostram-se adeptos do patrimonialismo e bastante preocupados com o uso político, como em campanhas eleitorais, por exemplo, das informações. De acordo com os relatos dos gestores públicos, há certa resistência quanto à disponibilização de informações, sendo publicadas predominantemente aquelas indicadas pelo controle interno da instituição. Os dados de disponibilização obrigatória são fornecidos sem ressalvas, enquanto os demais passam por “filtro” da administração, o que tem impedido a efetividade da LAI. Percebe-se, assim, que para a LAI se concretizar na região em análise como uma política pública, é urgente a capacitação de servidores e gestores públicos quanto ao acesso à informação, tendo em vista que são esses os responsáveis por implementar tal política e contatar o cidadão, representando o Estado nessa relação.

Conclusões de cunho prático, obtidas nesta investigação, recaem sobre a identificação de algumas práticas que podem ter impactado nos resultados da transparência mensurada. Uma delas é o fato de alguns portais serem administrados por empresas terceirizadas. Essas empresas não apenas fornecem aos municípios o software de gestão pública, como também alimentam o sistema, liberando acesso somente para a postagem de notícias, criando uma relação de dependência desses prestadores de serviço. Outra constatação refere-se a uma prática positiva, relacionada à manifestação da transparência na gestão pública de outras formas, além da internet, como, por exemplo, a realização de reuniões descentralizadas e a criação do gabinete móvel, levando o executivo municipal até as comunidades, incentivando a participação popular.

Ainda que o estudo tenha rigor metodológico faz-se necessário apontar suas limitações. O nível de transparência foi apurado na primeira fase da pesquisa, obtido através da análise dos dados coletados nos portais eletrônicos mantidos pelas prefeituras municipais, as quais podem não apresentar o conteúdo de forma organizada e clara, dificultando o acesso. Outra limitação é o fato de no ano de 2016 terem ocorrido eleições para o pleito municipal, acarretando a mudança de governo na maioria dos municípios investigados. Dessa forma, as entrevistas podem trazer alguns resultados que contrastam dos evidenciados nos portais eletrônicos, sem, contudo, comprometer os resultados do estudo.

Como sugestão para a realização de novas pesquisas sobre o tema, recomenda-se abordar a transparência utilizando outros instrumentos de mensuração, como a Escala Brasil Transparente (EBT), instrumento desenvolvido pela Controladoria Geral da União para avaliar o grau de cumprimento às normas da Lei de Acesso à Informação (LAI) por municípios, estados e Distrito Federal. A metodologia pretende refletir o cenário da transparência pública em todo o Brasil. Outras sugestões referem-se à investigação sobre a percepção dos usuários dos portais eletrônicos do governo municipal, a fim de identificar a demanda de informações sobre a gestão pública; e a verificação de como os cidadãos compreendem a transparência e qual a perspectiva da sociedade no relacionamento Governo x Cidadão.

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Agradecimentos:

Os autores agradecem ao CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – pelo apoio financeiro ao projeto de processo nº  405563/2016-7.