Artigos
Consequentes de
Motivação do Serviço Público: Proposição de um Framework de Análise em
Organizações Públicas Brasileiras
Public Service Motivation
Consequences: Proposition of an Analysis Framework in Brazilian Public
Organizations
Consecuencias de Motivación
del Servicio Público: Proposición de un Framework de Análisis en Organizaciones
Públicas Brasileñas
Jefferson Menezes de Oliveira jefferson@ufsm.br
Universidade Federal
de Santa Maria, Brasil
Vania de Fátima Barros Estivalete vaniaestivalete@ufsm.br
Universidade Federal do
Rio Grande do Sul, Brasil
Consequentes de Motivação do Serviço Público: Proposição de um
Framework de Análise em Organizações Públicas Brasileiras
Administração
Pública e Gestão Social, vol.
11,
núm. 4, 2019
Universidade Federal de Viçosa
Recepção: 17 Janeiro 2019
Aprovação: 13 Agosto 2019
Publicado:
01
Outubro 2019
Resumo:
O presente trabalho tem por objetivo
propor um framework de análise para a Motivação do Serviço Público (MSP) em
organizações do setor público brasileiro, mais especificamente explorando seus
reflexos sobre o Ajuste Indivíduo-Organização (AIO) e o Comportamento de
Cidadania Organizacional (CCO). O modelo oferecido apresenta proposições
elaboradas a partir da teoria e, uma vez validado empiricamente, possibilitará
investigar as influências da MSP sobre a percepção de congruência de valores
entre indivíduo e organização e, também, sobre a propensão à manifestação de
comportamentos discricionários que podem ser positivos ao ambiente
organizacional.
Palavras-chave:
Motivação
do Serviço Público, Framework de Análise, Consequentes.
Abstract: This paper aims to propose an analytical framework for Public
Service Motivation (PSM) in organizations of the Brazilian public sector,
specifically exploring its impacts on the Person-Organization Fit (P-O Fit) and
Organizational Citizenship Behavior (OCB). The model offered presents
propositions elaborated from the theory and once empirically validated, will
allow to investigate the influences of PSM on the perception of congruence
between individual and organization values and also on the propensity to the
manifestation of discretionary behaviors that can be positive to the
organizational environment.
Keywords: Public Service
Motivation, Analysis Framework, Consequences.
Resumen: El presente trabajo tiene como objetivo proponer un framework de
análisis para la Motivación del Servicio Público (MSP) en organizaciones del
sector público brasileño, explorando específicamente sus reflejos sobre el
Ajuste Individuo-Organización (AIO) y el Comportamiento de Ciudadanía
Organizacional (CCO). El modelo ofrecido presenta proposiciones elaboradas a
partir de la teoría y, una vez validado empíricamente, permitirá investigar las
influencias de la MSP sobre la percepción de congruencia de valores entre
individuo y organización y, también, sobre la propensión a la manifestación de
comportamientos discrecionales que pueden ser positivos al ambiente
organizacional.
Palabras clave: Motivación para el
Servicio Público, Framework de Análisis, Consecuencias.
1 INTRODUÇÃO
Em organizações públicas, uma das importantes questões de
pesquisa e desafios práticos na área de gestão de pessoas e comportamento
organizacional é compreender o processo de motivação de seus trabalhadores (Park
& Rainey, 2008). Nesse sentido, o conceito de Motivação do Serviço
Público (MSP), ou Public Service Motivation (PSM), surge como uma lente pela
qual gestores e pesquisadores poderão ampliar tal compreensão.
O conceito de MSP logrou difusão a partir da publicação do
artigo “The Motivational Bases of Public Service”, de autoria dos pesquisadores
Perry
e Wise (1990). Inicialmente, a MSP foi concedida como uma predisposição
individual para responder a motivações fundamentadas, principalmente ou
exclusivamente, em instituições e organizações públicas (Perry
& Wise, 1990). Após refinamento conceitual, Kim
et al. (2013) inferem que a MSP se refere a um tipo de motivação pró-social
que impulsiona os indivíduos a trabalharem pelo bem comum, comprometidos com os
valores públicos, com empatia e solidariedade aos demais indivíduos e sujeitos
a sacrifícios pessoais em prol da sociedade.
Internacionalmente, são crescentes os estudos que abordam os
consequentes de MSP nas organizações, tais como sua influência na escolha pelo
emprego público (Vandenabeele,
2008;
Clerkin & Coggburn, 2012; Carpenter,
Doverspike & Miguel, 2012), nas percepções de ajuste entre indivíduo e
organização (Bright,
2008; Kim,
2012; Bright,
2013), nas atitudes gerais que são benéficas para o desempenho
organizacional, tais como o comprometimento organizacional e a satisfação no
trabalho (Taylor,
2008; Kim,
2012; Ritz,
2009) e em comportamentos específicos, tais como o comportamento de
cidadania organizacional - CCO (Cun,
2012; Ferdousipour,
2016; Gould-Williams,
Mostafa, & Bottomley, 2015; Kim,
2006; Koumenta,
2015).
O presente estudo busca explorar os reflexos da MSP sobre
percepções e comportamentos considerados profícuos às organizações públicas por
meio da proposição de um modelo inovador ao contexto brasileiro. Sendo assim,
busca-se propor um framework de análise da motivação do serviço público e suas
influências sobre as percepções de ajuste entre indivíduo e organização e o
comportamento de cidadania organizacional em organizações públicas brasileiras.
O Ajuste Indivíduo-Organização (AIO), opção de tradução para a
expressão Person-Organization Fit (P-O Fit), ocorre quando os funcionários
acreditam que seus valores são congruentes com os valores da organização (Cable
& Derue, 2002). Em estudos internacionais, além de ser considerado um
consequente direto da MSP, o AIO é sinalizado como um possível elemento
mediador na interação entre a MSP e outros resultados, tais como a atração para
organizações do setor público (Carpenter
et al., 2012), a satisfação no trabalho (Bright,
2008; Kim,
2012; Steijn,
2008; Wright
& Pandey, 2008), o comprometimento organizacional (Kim,
2012), a permanência no trabalho atual (Steijn,
2008; Bright,
2008) e o CCO (Gould-Williams
et al., 2015).
Em relação ao CCO, ressalta-se que o contexto de trabalho, além
de abarcar tarefas relacionadas ao desempenho de funções relativas ao núcleo
técnico da organização, compreende facetas variáveis de comportamento
discricionário que podem propiciar um cenário organizacional positivo (Becton,
Carr, Mossholder, & Walker, 2017). Enquanto comportamento
discricionário que não é reconhecido pelo sistema formal de recompensas, o CCO
pode contribuir para a eficácia organizacional (Organ,
1988), sobretudo por meio de suas contribuições para a manutenção e
aprimoramento do contexto social e psicológico que dá suporte ao desempenho das
tarefas (Organ,
1997). Nesse contexto, pressupõe-se que indivíduos voltados ao interesse
público irão visualizar seu trabalho de forma mais ampla, despendendo esforços
que superem suas atividades rotineiras e formais. Sendo assim, é provável que
indivíduos com MSP manifestem o CCO com mais frequência (Koumenta,
2015).
De acordo com o estudo de Gould-Williams
et al. (2015), realizado no contexto egípcio, os efeitos positivos da MSP
sobre o CCO foram, além de diretos, mediados pela percepção de congruência
entre os valores dos trabalhadores e os da organização. Perante o exposto,
postula-se que a MSP pode influenciar diretamente o AIO e o CCO nas
organizações públicas brasileiras. Complementarmente, presume-se a existência
de um efeito indireto da MSP sobre o CCO por intermédio do AIO.
O presente trabalho, portanto, tem por objetivo propor um
framework de análise da MSP para o setor público brasileiro, mais
especificamente explorando seus reflexos sobre o AIO e o CCO. Compreende-se que
o referido setor possui componentes próprios, os quais tornam desafiadores os trabalhos
relacionados ao comportamento humano. De acordo com Bergue
(2010), são condicionantes, dentre outras, as normativas das relações entre
administração e agente público, a natureza dos bens e serviços oferecidos, a
dinâmica das atividades internas ao ambiente de trabalho e as relações
pessoais. Por isso, os administradores públicos devem ampliar suas capacidades
de compreender os mecanismos motivacionais e de comportamento dos indivíduos em
ambientes organizacionais com pujantes traços burocráticos e patrimonialistas.
Conforme Bright
(2008), uma vez identificada a associação entre a MSP e resultados
positivos para as organizações públicas, o construto pode ser concebido como um
guia para socializar e treinar funcionários. Além disso, este estudo é
justificado pelo oferecimento de uma agenda de pesquisa para as áreas de
administração pública e comportamento organizacional no contexto brasileiro. O
trabalho segue estruturado com as seções de fundamentação teórica, apresentação
do framework proposto e considerações finais.
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Esta seção tem por intuito apresentar concepções teóricas sobre
o construto Motivação do Serviço Público (MSP), bem como seus principais
consequentes identificados na literatura internacional, com ênfase no Ajuste
Indivíduo-Organização (AIO) e no Comportamento de Cidadania Organizacional
(CCO). As concepções trazidas pela literatura constituíram os alicerces para a
proposição do framework de análise apresentado na seção subsequente.
2.1 Motivação do Serviço Público (MSP)
Até a década de 1980, a noção de motivação específica associada
ao serviço público não havia logrado clareza conceitual. Era tratada de forma
ampla e multifacetada e até mesmo confundida com outros construtos (Buchanan,
1975; Rainey,
1982). De forma a preencher tal lacuna conceitual, uma definição mais
robusta e consistente de MSP foi desenvolvida somente na década de 1990, quando
Perry
e Wise (1990) a definiram como uma predisposição individual para responder
a motivações fundamentadas, principalmente ou exclusivamente, em instituições e
organizações públicas.
A partir das concepções de Knoke
e Wright-Isak (1982),
Perry e Wise (1990) identificaram três bases teóricas ou “motivos” da MSP: Racional,
normativo e afetivo. Em primeiro lugar, os motivos racionais baseiam-se na
maximização da utilidade individual e são manifestados quando os indivíduos
querem participar do processo político, estão comprometidos e identificados com
um programa público e servem como defensores de um interesse especial ou
privado. Em segundo lugar, os motivos normativos se baseiam no desejo de
perseguir o bem comum e, além disso, o interesse público. Esses motivos incluem
patriotismo, dever e lealdade ao governo. Em terceiro lugar, os motivos
afetivos são fundamentados na emoção humana e são caracterizados por um desejo
e disposição para ajudar os outros (Perry
& Wise, 1990; Knoke
& Wright-Isak, 1982).
Em trabalho posterior, a partir de tais “motivos” e da noção de
auto sacrifício, Perry
(1996) identificou e operacionalizou um conjunto de vinte e quatro (24)
itens distribuídos em quatro dimensões distintas para mensurar a MSP: (i)
Atração para a elaboração de políticas públicas, (ii) comprometimento com o
interesse público/dever cívico, (iii) compaixão e (iv) auto sacrifício (Perry
& Wise, 1990; Camilleri,
2007; Wright
& Pandey, 2008).
Os estudos pioneiros de Perry
e Wise (1990) e Perry
(1996) fizeram com que surgisse uma nova agenda de pesquisa internacional
em administração pública, tornando a MSP um construto alvo de constante
refinamento conceitual. Brewer
e Selden (1998), por exemplo, definiram a MSP como a força motivacional que
induz os indivíduos a realizarem um serviço público significativo, sendo
predominante entre a força de trabalho do setor público. Scott
e Pandey (2005) apontaram que o conceito de MSP denota a ideia de
comprometimento com o serviço público, a busca do interesse público e o desejo
de realizar um trabalho oportuno para a sociedade.
Kim (2006), por sua vez, complementou que a MSP é caracterizada por uma prevalência
de recompensas intrínsecas sobre recompensas extrínsecas.
Kim
e Vandenabeele (2010), em refinamento teórico posterior, inferem que a MSP
é permeada pela noção de auto sacrifício e está associada aos motivos
instrumental, baseado em valores e de identificação. Esses autores, portanto,
apresentaram uma revisão das bases teóricas apontadas por Perry
e Wise (1990), excluindo o interesse privado como componente de MSP.
Os motivos instrumentais são baseados no altruísmo e incluem
trabalhar no setor público, participar do processo político e atividades
comunitárias, participar de atividades de desenvolvimento social e defender
políticas e programas públicos especiais, a fim de realizar um serviço público
significativo para a sociedade. Motivos baseados em valores referem-se aos
valores públicos finalísticos que os indivíduos desejam alcançar através de
seus comportamentos e ações. Trata-se de uma internalização dos valores
públicos, ou seja, os indivíduos podem considerar os valores públicos como seus
próprios valores. Os valores públicos podem incluir o interesse público, a
responsabilidade social, a democracia, a equidade social, a justiça social, a
neutralidade e a responsabilidade. Os motivos de identificação dizem respeito a
pessoas, grupos ou objetos que os indivíduos desejam servir. Esse processo de
identificação traz a disposição para fazer o bem e até mesmo se sacrificar
pelos elementos identificados. Esta base, portanto, enfatiza o comprometimento
afetivo de um indivíduo ou preocupação com as necessidades de outros indivíduos
ou grupos específicos (Kim
& Vandenabeele, 2010).
A partir das bases teóricas revisadas por Kim
e Vandenabeele (2010), Kim
et al. (2013) realizaram uma pesquisa em 12 países – Austrália, Bélgica,
China, Dinamarca, França, Itália, Coreia do Sul, Lituânia, Holanda, Suíça,
Reino Unido e Estados Unidos – com a finalidade de validar um instrumento
internacional para mensurar a MSP. Com base no refinamento e esclarecimento de
quatro dimensões operacionais da MSP, foram gerados itens para mensurar a
atração para o serviço público (ASP), o comprometimento com os valores públicos
(CVP), a compaixão (COM) e o auto sacrifício (AS). O Quadro
01 apresenta as definições dessas dimensões.
Dimensão |
Descrição |
Atração para o
Serviço Público (ASP) |
Dimensão que analisa
a disposição de servir ao público de forma significativa, de trabalhar pelo
bem comum e de participar do processo de desenvolvimento e implementação de
políticas públicas. |
Comprometimento com
os Valores Públicos (CVP) |
Dimensão que analisa
a disposição pessoal para buscar o interesse público e os valores públicos.
Envolve julgar importante a igualdade de oportunidades e a prestação contínua
de serviços públicos, agir eticamente e preocupar-se com as gerações futuras.
|
Compaixão (COM) |
Dimensão que analisa
a ligação afetiva com outros membros de uma categoria social ou de um sistema
político. Envolve ter empatia e solidariedade com os menos favorecidos, ser
pautado pela justiça e considerar o bem-estar dos outros muito importante. |
Auto Sacrifício (AS)
|
Considerada uma
dimensão que dá suporte às demais, envolve a realização de sacrifícios
pessoais em prol da sociedade. Essa dimensão é bastante semelhante à
existente na escala de Perry
(1996). |
Fonte: elaborado a partir de Kim
et al. (2013).
Salienta-se que os países pesquisados por Kim
et al. (2013) não diferiram quanto ao número ou à composição das quatro
dimensões representadas no instrumento de mensuração da MSP, o que lhe conferiu
uma invariância configural. No entanto, a força da relação entre cada dimensão
e seus itens não foi a mesma em todos os 12 países, o que não conferiu
invariância métrica ao instrumento. Por isso, Kim
et al. (2013) apontam que o significado das dimensões da MSP poderá diferir
entre culturas e idiomas, sendo esse um ponto a ser considerado pelos
pesquisadores que desejam verificar a validade da escala em novos contextos.
Kim
(2017), ao ponderar que o estudo anterior (Kim
et al., 2013) não alcançou a invariância métrica para a escala de MSP entre
todas as culturas e línguas analisadas, desenvolveu um novo arranjo de itens
para mensurar a MSP no contexto coreano, tendo em vista a obtenção das mesmas
propriedades psicométricas entre diferentes grupos do país. Nessa revisão da
escala internacional, Kim
(2017) logrou confiabilidade, validade convergente e validade discriminante
para um modelo de 29 itens distribuídos em quatro dimensões de análise para o
construto (Atração para o Serviço Público - ASP, Comprometimento com os Valores
Públicos - CVP, Compaixão - COM e Auto Sacrifício - AS).
Portanto, tendo em vista as recentes concepções teóricas, a MSP
pode ser concebida como uma força que impulsiona os indivíduos a trabalharem
pelo bem comum, comprometidos com os valores públicos, com empatia e
solidariedade aos demais indivíduos e sujeitos a sacrifícios pessoais em prol
da coletividade (Kim
et al., 2013; Kim,
2017). Destaca-se que esse conceito possui relação complementar com a noção
de vocação, sobretudo, por associar-se a um “chamado” atribuído ao indivíduo
que deseja realizar um trabalho socialmente útil (Thompson
& Christensen, 2018).
Por fim, destaca-se que a pesquisa sobre MSP pode ser
classificada em seis temas principais na atualidade: (i) A construção e sua
mensuração, (ii) a incidência, (iii) os antecedentes, (iv) os resultados, (v)
os sistemas organizacionais e (vi) a interação com outros tipos de motivação (Kim
& Vandenabeele, 2010). Considerando que o presente estudo tem por
objetivo explorar reflexos da MSP no contexto do setor público brasileiro, a
próxima subseção apresenta os principais consequentes identificados na
literatura internacional.
2.2
Consequentes de MSP
Em relação aos efeitos da MSP, identifica-se que o construto é
considerado um antecedente de diversos fatores individuais e organizacionais.
Preliminarmente, Perry
e Wise (1990) levantaram a hipótese de que indivíduos com altos níveis de
MSP teriam níveis significativamente maiores de satisfação no trabalho,
desempenho e comprometimento em organizações públicas quando comparados com
indivíduos com níveis mais baixos de MSP.
Considerando a literatura internacional, verifica-se que a MSP é
amplamente associada à satisfação no trabalho (Naff
& Crum, 1999;
Vandenabeele, 2007; Steijn,
2008; Taylor,
2008; Bright,
2008; Wright
& Pandey, 2008; Bangcheng,
2009; Georgellis & Tabvuma, 2010; Kim,
2011; Kim,
2012; Cun,
2012; Taylor,
2014; Liu,
Tang, & Yang, 2015; Teo,
Pick, Xerri, & Newton, 2016; Liu
& Perry, 2016; Simone,
Cicotto, Pinna, & Giustiniano, 2016).
Além disso, verifica-se a constante associação da MSP aos
consequentes: Comprometimento organizacional (Crewson,
1997; Taylor,
2008; Ritz,
2009, Kim,
2012; Caillier,
2015b; Riba
& Ballart, 2016; Caillier,
2016), comportamento de cidadania organizacional (Kim,
2006; Cun,
2012; Gould-Williams
et al., 2015; Koumenta,
2015; Ferdousipour,
2016), comportamento extra papel (Caillier,
2015; Caillier,
2016), comportamento pró-social (Esteve,
Urbig, Van Witteloostuijn, & Boyne, 2016; Piatak,
2016), comportamento de cidadania interpessoal (Pandey,
Wright, & Moynihan, 2008), comportamento de cidadania comunitária (Liu,
Zhang, Du, & Hu, 2015; Liu
& Perry, 2016), comportamento ético/intenção de denunciar (Brewer
& Selden, 1998;
Wright, Hassan, & Park, 2016), identificação organizacional (Liu
& Perry, 2016), compartilhamento do conhecimento (Chen
& Hsieh, 2015; Tuan,
2016), engajamento no trabalho (Simone
et al., 2016), propensão ao voluntariado (Houston,
2005; Clerkin,
Paynter, & Taylor, 2009; Piatak,
2016), escolha por trabalhar no setor público (Vandenabeele,
2008; Steijn,
2008;
Clerkin & Coggburn, 2012; Carpenter
et al., 2012; Pedersen,
2013), intenção de permanecer na organização (Naff
& Crum, 1999; Bright,
2008, Steijn,
2008), ajuste indivíduo-organização (Bright,
2008; Kim,
2012; Bright,
2013), valência da missão institucional (Wright,
Moynihan, & Pandey, 2012; Caillier,
2015), aceitação de mudanças organizacionais (Wright,
Christensen, & Isett, 2013) e desempenho no trabalho (Bellé,
2013; Caillier,
2014; Cheng,
2015; Schwarz,
Newman, Cooper, & Eva, 2016; Van
Loon, 2016).
O estudo meta-analítico de Harari,
Herst, Parola e Carmona (2017) apontou que os indivíduos que tendem a
valorizar o bem comum, em detrimento das necessidades individuais, criam um
ajuste mais forte entre os objetivos pessoais e os objetivos organizacionais.
Esse foco maior no coletivo em nível social não apenas cria um alinhamento
entre os valores da organização e as necessidades individuais (Vandenabeele,
2007), mas também fortalece a satisfação no trabalho, pois os indivíduos
são capazes de satisfazer suas necessidades pró-sociais por meio do trabalho (Bright,
2008).
Sendo assim, à medida que as organizações do setor público são
encarregadas de promover o bem-estar geral da sociedade, prevê-se que a força
de trabalho desse setor incluirá indivíduos com valores semelhantes, buscando oportunidades
para satisfazer seus motivos altruístas para servir ao público. Sendo assim, é
possível pressupor que indivíduos motivados para o serviço público estarão
melhor ajustados em organizações públicas pela congruência de valores (Wright,
2007; Gould-Williams
et al., 2015).
Nesse sentido, enquanto possível consequente de MSP, torna-se
conexo o conceito de Ajuste Indivíduo-Organização (AIO), opção de tradução para
a expressão Person-Organization Fit (P-O Fit). Esse tipo de ajuste ocorre
“quando os funcionários acreditam que seus valores correspondem aos valores da
organização e aos valores de outros funcionários da organização” (Cable
& Derue, 2002, p. 876), compondo uma das dimensões do ajuste entre
indivíduo e ambiente de trabalho, ou Person-Environment Fit (P-E Fit), conceito
oriundo da psicologia interacional.
Para avaliar o AIO existem formas diretas e indiretas. A
primeira mensura o ajuste percebido, por correspondência ou semelhança, entre a
pessoa e a organização. Nesse sentido, os entrevistados são questionados sobre
o ajuste entre si e sua organização de forma direta (Kristof,
1996; Edwards
et al., 2006; Cable
& Derue, 2002; Cable
& Judge, 1996; Saks
& Ashforth, 1997). As formas indiretas de avaliar o AIO, por sua vez,
envolvem uma comparação entre características individuais e organizacionais
separadamente (Kristof,
1996) e podem ser consideradas subjetivas ou objetivas.
Destaca-se a medida direta concebida por Cable
e DeRue (2002), a qual considera três dimensões de ajuste. A primeira
dimensão é centrada no AIO, enquanto uma congruência de valores, referindo-se
ao aspecto suplementar ou ajuste por similaridade apoiado em estudos anteriores
(Cable
& Judge, 1996; Chatman,
1989; Lauver
& Kristof-Brown, 2001). A segunda dimensão é centrada na satisfação das
necessidades dos indivíduos por parte da organização (needs-supplies fit), um
dos aspectos complementares do ajuste (Kristof,
1996). A terceira dimensão, por fim, é relacionada ao atendimento das
demandas organizacionais por parte do indivíduo apoiado na existência das
habilidades necessárias (demands-abilities fit), o segundo aspecto complementar
do ajuste (Kristof,
1996; Cable
& Judge, 1996).
No estudo de Cable
e DeRue (2002), as percepções de AIO enquanto congruência de valores
(ajuste por similaridade) foram relacionadas a resultados organizacionais, tais
como identificação organizacional, comportamento de cidadania organizacional e
decisões de rotatividade, enquanto que as percepções de adequação entre
necessidades e suprimentos foram relacionadas a atitudes no trabalho, tais como
satisfação e comprometimento. A adequação entre habilidades e demandas não foi
relacionada aos efeitos hipotetizados no estudo.
Em relação à conexão entre motivação individual e comportamentos
considerados fundamentais aos desempenhos individual e organizacional, alguns
estudos têm associado MSP ao Comportamento de Cidadania Organizacional (CCO).
De acordo com o estudo meta-analítico de Harari
et al. (2017), os indivíduos com foco no coletivo possuem objetivos
compartilhados e estão inclinados à cooperação e à manifestação de
comportamentos discricionários na organização. Nesse entendimento, em estudo
realizado na Coreia do Sul, Kim
(2006) indicou que os funcionários públicos com maior nível de MSP são
comprometidos com o bem público, seguem condutas pautadas pela benevolência,
buscam servir aos demais cidadãos e possuem o desejo de influenciar sua
comunidade. Além disso, atuam no alcance de objetivos políticos para melhorar o
bem público e, voluntariamente, assumem responsabilidades extras e se envolvem
em comportamentos pró-sociais.
Organ
(1988) definiu o CCO como um comportamento individual discricionário, não
reconhecido diretamente ou explicitamente pelo sistema de recompensa formal,
que promove o efetivo funcionamento da organização. A formulação desse conceito
assentou-se nos estudos de Barnard
(1938), sobretudo em relação ao conceito de “vontade de cooperar”, e Katz
e Kahn (1978), em relação à diferenciação entre o desempenho da função
habitual e os comportamentos considerados inovadores e espontâneos (Podsakoff,
MacKenzie, Paine, & Bachrach, 2000).
Mais tarde, Organ
(1997) buscou uma reconstrução para o conceito de CCO. Por “discricionário”
o autor quis dizer que esse comportamento não é um requisito obrigatório
exigido do trabalho ou da descrição do cargo, mas uma escolha pessoal.
Recompensas decorrentes de CCO seriam, no máximo, aleatórias e indiretas em
comparação com as recompensas decorrentes de contribuições formais. Quanto à
efetividade, Organ
(1997) aponta que nem todo CCO faz a diferença nos resultados
organizacionais. Por tais motivos, o autor passa a conceber o CCO como sinônimo
de desempenho contextual associado a contribuições para a manutenção e
aprimoramento do contexto social e psicológico que dá suporte ao desempenho das
tarefas na organização.
Os estudos sobre CCO distinguem várias dimensões para a
compreensão do fenômeno. De acordo com Organ
(1988), o CCO abarca altruísmo (por exemplo, ajudar outra pessoa em tarefa
ou problema organizacional relevante), cortesia (por exemplo, despender
esforços para prevenir um problema ou tomar medidas antecipadamente para
mitigá-lo), conscienciosidade (por exemplo, apresentar comportamentos
relacionados ao seu papel formal que superem os níveis mínimos exigidos),
esportivismo (por exemplo, abster-se de queixas insignificantes) e virtude
cívica (por exemplo, participar de forma responsável, preocupando-se com a vida
da organização).
Uma segunda grande dimensionalidade de CCO foi proposta por Williams
e Anderson (1991). Esses autores classificaram o CCO em duas categorias,
com base no alvo ou direção do comportamento. Mais especificamente, eles
definiram o Comportamento de Cidadania Organizacional orientado à Organização
(CCO-O) e o Comportamento de Cidadania Organizacional orientado para outros
Indivíduos (CCO-I). Todas as dimensões de CCO dispostas por Organ
(1988) podem ser capturadas pelo esquema conceitual de Williams
e Anderson (1991). Enquanto as dimensões altruísmo e cortesia podem ser
associadas ao CCO-I, as dimensões conscienciosidade, virtude cívica e
esportivismo podem ser associadas ao CCO-O (Andrade,
2017; Podsakoff
et al., 2000; Podsakoff
et al., 2014).
Lee
e Allen (2002), assim como Williams
e Anderson (1991), consideraram a distinção entre CCO-O e CCO-I. Sendo
assim, em revisão à teoria e aos modelos existentes, esses autores
desenvolveram oito novos itens para cada um dos tipos de CCO. Enquanto o CCO- I
envolve itens voltados à cooperação entre colegas de trabalho, o CCO-O
refere-se a comportamentos de melhoria da imagem, defesa, lealdade e
desenvolvimento da organização. A revisão de itens realizada por Lee
e Allen (2002) teve por intuito abranger comportamentos que são claramente
benéficos aos indivíduos e à organização, sendo evitada a sobreposição com o
comportamento desviante no trabalho, situação sinalizada para o modelo de Williams
e Anderson (1991).
Compreende-se, portanto, que o CCO pode desencadear resultados
positivos nas organizações. No setor público não é diferente, na medida em que
esses comportamentos podem contribuir para a melhoria dos serviços prestados,
superando os males da burocracia e incentivando o desempenho nas diversas
unidades de trabalho (Vigoda-Gadot
& Beeri, 2011).
No entanto, ainda são inscipientes os estudos sobre CCO no setor
público, fato considerado paradoxal por Vigoda-Gadot
e Beeri (2011), uma vez que a expressão cidadania é uma terminologia básica
na ciência política, podendo ser somada à Nova Administração Pública por esta
enfatizar o papel das pessoas na construção de uma governança efetiva. O CCO,
então, relaciona-se com os objetivos e a visão da administração pública
moderna, despertando para investigações sobre seus antecedentes nas
organizações.
Na atualidade, Organ
(2018) sugere a realização de estudos empíricos sobre CCO em locais de
trabalho não norte-americanos, a fim de que possam ser identificadas diferenças
na sua dimensionalidade e nos seus impactos na eficácia organizacional. Além
disso, o estudo de realidades distintas pode permitir a identificação de novos
correlatos e antecendentes desse comportamento.
3 PROPOSIÇÃO DO FRAMEWORK DE ANÁLISE DE CONSEQUENTES DE MSP
Primeiramente, destaca-se que a realização de consultas à
produção científica internacional relativa à Motivação do Serviço Público (MSP)
foi fundamental para o estabelecimento do framework de análise proposto. Por
meio dessas consultas foi possível a definição de potenciais construtos
consequentes que podem ser profícuos ao contexto das organizações públicas
brasileiras: O Ajuste Indivíduo-Organização (AIO) e o Comportamento de
Cidadania Organizacional (CCO).
Ao examinar as origens teóricas, os conceitos, os modelos
desenvolvidos, as dimensionalidades dos construtos e os antecedentes e consequentes
identificados em estudos anteriores, foi possível o estabelecimento de um
modelo de análise para investigações empíricas no contexto brasileiro, o qual é
apresentado na Figura
01.
Fonte: elaborada
pelos autores
Em decorrência da formulação do framework ilustrado pela Figura
01, proposições são apresentadas na sequência com a finalidade de subsidiar
processos futuros de validação empírica.
Relativamente à abordagem da MSP no Brasil, Buiatti
(2007) realizou o processo de validação da escala de mensuração formulada
por Perry
(1996), porém, seus resultados indicaram a necessidade de revisar a
operacionalização dos itens, bem como a contextualização das dimensões de MSP
no país. Sendo assim, propõe-se que a análise da MSP no contexto brasileiro
ocorra a partir dos pressupostos oferecidos pelos estudos de Kim
e Vandenabeele (2010), Kim
et al. (2013) e Kim
(2017).
Em superação ao modelo de Perry
(1996), Kim
e Vandenabeele (2010) assinalaram a necessidade de reconstrução do
instrumento de mensuração de MSP, a fim de que o mesmo possa ser validado
internacionalmente com menos modificações. Esses autores inferem que a MSP é
permeada pela noção de auto sacrifício e está associada a três tipos aos
motivos: Instrumental, baseado em valores e de identificação.
A partir dessas constatações,
Kim et al. (2013) desenvolveram um modelo de mensuração pelo qual a MSP foi
composta por quatro dimensões: Atração para o Serviço Público (ASP),
Comprometimento com os Valores Públicos (CVP), Compaixão (COM) e Auto
sacrifício (AS), cuja composição de itens foi confirmada em 12 países.
Posteriormente, Kim
(2017) buscou atingir melhores propriedades psicométricas para essa
dimensionalidade em pesquisa realizada no contexto coreano. Em decorrência,
alguns itens da escala concebida por
Kim et al. (2013) foram revisados para melhor adaptação ao contexto
institucional do país, aprimorando as propriedades psicométricas do instrumento
em diferentes amostras utilizadas na pesquisa.
Em relação ao Ajuste Indivíduo-Organização (AIO), opta-se por
considerar a dimensão referente à congruência entre valores individuais e
valores organizacionais, oferecida por Cable
e DeRue (2002). Seus itens mensuram o ajuste percebido de compatibilidade
por similaridade e associam-se principalmente a resultados organizacionais,
tais como identificação organizacional, comportamentos de cidadania
organizacional e decisões de rotatividade.
De acordo com Perry
e Wise (1990), quanto maior a MSP de um indivíduo, maior a atração por
organizações públicas que compreendam suas motivações de serviço público. Uma
vez que as organizações do setor público são encarregadas de promover o
bem-estar geral da sociedade, presume-se que sua força de trabalho incluirá
indivíduos com valores semelhantes, buscando oportunidades para satisfazer seus
motivos altruístas em servir ao público (Wright,
2007).
Sendo assim, pode-se argumentar que os indivíduos com altos
níveis de MSP são mais propensos do que outros a ter valores e objetivos
semelhantes aos da organização que oferece serviços públicos (Jin,
Mcdonald, & Park, 2018). Conforme Christensen
e Wright (2011), a MSP promove a congruência entre os valores dos
servidores públicos e as missões das organizações públicas.
Portanto, a MSP pode ser uma estratégia eficaz para recrutar
pessoas que estarão naturalmente orientadas para os ambientes de trabalho do
serviço público, pois, de acordo com estudos de Bright
(2008; 2013), os funcionários públicos com altos níveis de MSP foram
significativamente compatíveis com as características de sua organização.
Esses apontamentos são também consistentes com os estudos
empíricos de Gould-Williams
et al. (2015) e Jin
et al. (2018), os quais identificaram uma influência direta (positiva e
significativa) da MSP sobre o AIO em pesquisas realizadas junto a funcionários
públicos egípcios e professores do ensino superior norte-americanos, respectivamente.
Esse contexto interacional permitiu o desenvolvimento da primeira proposição:
P1: A Motivação do Serviço Público (MSP) influencia
positivamente o Ajuste Indivíduo-Organização (AIO) no setor público brasileiro.
Em relação ao Comportamento de Cidadania Organizacional (CCO),
considera-se o modelo de Lee
e Allen (2002), o qual é uma revisão do modelo de Willians
e Anderson (1991) que avalia duas dimensões ou perspectivas: CCO orientado
à organização (CCO-O) e CCO orientado aos indivíduos (CCO-I).
Ainda que a MSP possa ser vista como um valor ou atitude que
motiva os indivíduos a se envolverem em comportamentos que beneficiam a
sociedade, entende-se que os comportamentos dos funcionários orientados para o
serviço público também beneficiarão a organização e seus colegas de trabalho (Gould-Williams
et al., 2015).
Assim, uma vez que os funcionários com altos níveis de MSP estão
dispostos a trabalhar no serviço público de forma significativa pelo bem comum,
comprometidos com os valores públicos, com empatia e solidariedade aos demais
indivíduos e dispostos a sacrifícios pessoais em prol da sociedade (Kim
et al., 2013), é possível que manifestem o CCO com mais frequência, tanto
em relação à organização, quanto aos demais indivíduos (Kim,
2006), despendendo esforços que superem suas atividades rotineiras e
formais (Koumenta,
2015).
Estudos internacionais recentes evidenciaram a influência da MSP
sobre o CCO em diferentes contextos (Kim,
2006; Cun,
2012; Ferdousipour,
2016; Gould-Williams
et al., 2015; Koumenta,
2015; Shim
& Faerman, 2017; Jin
et al., 2018), constatação que deu origem à seguinte proposição para o
contexto brasileiro:
P2: A Motivação do
Serviço Público (MSP) influencia positivamente o Comportamento de Cidadania
Organizacional (CCO).
Na sequência, o framework proposto busca elucidar a influência
do AIO sobre o CCO, bem como o efeito indireto que o primeiro pode apresentar na
interação entre a MSP e o CCO.
Chatman
(1989), ao embasar a teoria sobre o AIO, apontou que essa perspectiva de
compatibilidade faz com que os indivíduos contribuam de maneira construtiva com
seus colegas de trabalho e com a organização.
Wei
(2012), a partir da teoria da auto-identidade, infere que o AIO pode moldar
o comportamento individual em uma organização. Sendo assim, considera-se que os
indivíduos necessitam de um senso de pertencimento e que, quando os mesmos
percebem que a cultura e os valores organizacionais estão alinhados com seus
valores pessoais e objetivos de carreira, reações emocionais podem levar a
comportamentos que extrapolam suas obrigações formais (Jin
et al., 2018).
Portanto, quando os funcionários se identificam com os valores
de sua organização, ou seja, quando há um AIO, provavelmente irão contribuir
com a missão e os objetivos organizacionais. Nesse sentido, comportamentos para
a manutenção e aprimoramento do contexto social e psicológico (CCO) poderão ser
direcionados à organização e/ou aos colegas de trabalho com maior frequência e
intensidade (Organ,
1997; Cable
& Derue, 2002; Gould-Williams
et al., 2015). Consequentemente, foi definida a proposição:
P3: O Ajuste
Indivíduo-Organização (AIO) influencia positivamente o Comportamento de
Cidadania Organizacional (CCO).
Por fim, compreende-se que a interação entre a MSP e o CCO, além
de direta, pode ser influenciada por outros elementos. Nesse sentido, conforme
sinalizam estudos internacionais, destaca-se o papel do AIO enquanto
consequente de MSP e antecedente de CCO (Jin
et al., 2018). O estudo de Gould-Williams
et al. (2015), por exemplo, identificou que os efeitos positivos da MSP
sobre o CCO em funcionários públicos egípcios foram, além de diretos,
influenciados pelo grau de congruência entre os valores dos trabalhadores e os
da organização. Pressupõe-se que, conforme os funcionários com altos níveis de
MSP sentem que os seus valores e objetivos coincidem com os de sua organização
(quando há AIO), eles são mais propensos a manifestar o CCO. Tal constatação
deu origem à seguinte proposição:
P4: A Motivação do
Serviço Público (MSP) possui um efeito indireto e positivo sobre o
Comportamento de Cidadania Organizacional (CCO) por meio do Ajuste
Indivíduo-Organização (AIO).
Assim sendo, esboça-se a tese de que a MSP influencia
positivamente o AIO percebido, de que a MSP influencia positivamente o CCO, de
que o AIO influencia positivamente o CCO e de que a influência positiva da MSP
sobre o CCO, além de direta, é mediada pela percepção de AIO. A Figura 02
esquematiza as proposições passíveis de verificação empírica em decorrência do
framework de análise proposto.
Fonte:
elaborada pelos autores
Para que o framework proposto seja efetivado, previamente,
sugere-se a utilização de um protocolo de tradução e adaptação de escalas de
mensuração (Beaton,
Bombardier, Guillemin, & Ferraz, 2000). Posteriormente, sob a ótica
quantitativa, torna-se necessário o emprego de técnicas estatísticas para o
processo de validação dos instrumentos de coleta de dados no contexto brasileiro,
bem como para a análise de influências entres os construtos. Enquanto a Análise
Fatorial Confirmatória é indicada para verificar o quão bem a especificação de
fatores combina com a realidade, a Modelagem de Equações Estruturais é indicada
para explicar as relações entre múltiplas variáveis envolvidas na análise (Hair
et al., 2009).
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este artigo buscou prospectar uma agenda de pesquisa em
administração pública, mais especificamente relacionada ao comportamento
organizacional em organizações públicas brasileiras. Foram propostos caminhos
para a investigação dos reflexos da motivação do serviço público sobre
percepções e comportamentos que podem ser benéficos ao ambiente organizacional:
O ajuste indivíduo-organização e o comportamento de cidadania organizacional.
Acredita-se que o framework proposto, quando validado
empiricamente, oferecerá subsídios à interpretação do comportamento dos
trabalhadores das organizações públicas. Com as proposições oferecidas, torna-se
possível avaliar se os indivíduos dotados de motivações pró-sociais associadas
ao serviço público (relacionadas ao bem comum, aos valores públicos, à empatia
e à assunção de sacrifícios em prol da sociedade) estão ajustados à organização
em que atuam (relativamente à compatibilidade de valores) e propensos à
manifestação de comportamentos discricionários positivos ao ambiente
organizacional (direcionados aos colegas de trabalho e à organização de forma
geral).
Por limitação, o presente estudo possui a exposição de
proposições oferecidas a partir da teoria, sem o teste empírico em um contexto
específico. Por tal motivo, sugere-se que pesquisas futuras sejam realizadas no
sentido de validar empiricamente as proposições apresentadas em organizações
públicas brasileiras de múltiplas esferas e finalidades, sob diferentes
abordagens epsitemológicas e metodológicas. Além disso, aponta-se a
possibilidade de desdobramentos do framework proposto de forma a permitir, por
exemplo, análises do poder preditivo de cada dimensão de MSP sobre os
construtos considerados consequentes.
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