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Casos para Ensino

Educação e Inovação Social: A Formação Recíproca

Education and Social Innovation: The Reciprocal Formation

Educación e Innovación Social: La Formación Recíproca

Leonardo Ferreira Batista
Universidade Federal de Pernambuco, Brasil
Diogo Henrique Helal
Fundação Joaquim Nabuco e Universidade Federal de Pernambuco, Brasil

Educação e Inovação Social: A Formação Recíproca

Administração Pública e Gestão Social, vol. 15, núm. 2, 2023

Universidade Federal de Viçosa

Recepción: 31 Mayo 2022

Aprobación: 06 Septiembre 2022

Publicación: 21 Abril 2023

Resumo: Contexto do caso: Este caso para ensino discute a relação entre educação e inovação social, a partir de um dos episódios da série brasileira de documentários “Destino: Educação – Escolas Inovadoras” (Canal Futura), veiculada pela Globoplay, refletindo como a educação está associada à inovação social na prática. O documentário referido aborda o Projeto Âncora, escola localizada em Cotia/SP, em função de suas características inovadoras em destaque no contexto brasileiro.

Dilema do Caso: Com uma perspectiva freireana de aprendizagem transformativa, o caso, ao enfatizar uma Educação autônoma que contribui para a emancipação dos envolvidos, busca responder ao seguinte dilema: “A Educação pode gerar inovação social?”.

Fechamento do caso: As iniciativas discutidas permitem encaminhar a discussão nos dois sentidos: da Educação para a inovação social e vice-versa. Docentes de Ensino Superior em Administração, Gestão Pública, Pedagogia e cursos afins podem utilizar o caso em disciplinas que trabalhem direta ou indiretamente as temáticas discutidas.

Palavras-chave: Educação, Inovação Social, Abordagem Freireana, Mudança Social, Caso para Ensino.

Abstract: Case context: This teaching case discusses the relationship between education and social innovation, based on one of the episodes of the Brazilian documentary series “Destino: Educação – Escolas Inovadoras” (Futura Channel), broadcast by Globoplay, reflecting how education is associated with social innovation in practice. The aforementioned documentary addresses the Projeto Âncora, a school located in Cotia/SP, due to its innovative characteristics highlighted in the Brazilian context.

The dilemma of the Case: With a Freirean perspective of transformative learning, the case, by emphasizing an autonomous education that contributes to the emancipation of those involved, seeks to answer the following dilemma: “Can Education generate social innovation?”.

Case closure: The initiatives mentioned allow guiding the discussion in both directions: from Education to social innovation and vice versa. Teachers of Higher Education in Administration, Public Management, Pedagogy, and related courses can use the case in subjects that work directly or indirectly on the topics discussed.

Keywords: Education, Social Innovation, Freirean Approach, Social Change, Teaching Case.

Resumen: Contexto de caso: Este caso didáctico discute la relación entre educación e innovación social, a partir de uno de los episodios de la serie documental brasileña “Destino: Educação – Escolas Inovadoras” (Canal Futura), transmitida por Globoplay, que refleja cómo la educación se asocia con innovación en la práctica. El mencionado documental aborda el Projeto Âncora, una escuela ubicada en Cotia/SP, por sus características innovadoras destacadas en el contexto brasileño.

Dilema del Caso: Con una perspectiva freireana de aprendizaje transformador, el caso, al enfatizar una educación autónoma que contribuya a la emancipación de los involucrados, busca responder al siguiente dilema: “¿Puede la Educación generar innovación social?”.

Cierre del caso: Las iniciativas comentadas permiten orientar la discusión en los dos sentidos: de la Educación a la innovación social y viceversa. Los docentes de Educación Superior en Administración, Gestión Pública, Pedagogía y carreras afines pueden utilizar el caso en asignaturas que trabajen directa o indirectamente sobre los temas tratados.

Palabras clave: Educación, Innovación Social. Enfoque Freireano. Cambio Social. Caso para la Enseñanza.

Introdução

Este caso para ensino está empiricamente inspirado em uma escola – organização não-governamental (ONG) – que atende pessoas de baixa renda com vulnerabilidade social (200 crianças), moradores da comunidade em que a instituição está inserida – e tem a visão de atender todos os públicos. Essa instituição foi escolhida por enfocar princípios da inovação social e integrá-los à educação, como, por exemplo, a consulta aos estudantes, a participação e a dialogicidade.

Para um melhor entendimento da IS, precisamos enxergá-la como um conceito colaborativo que a dota de várias ações e de vários propósitos (Ziegler, 2017). Trata-se de um fenômeno presente nos âmbitos organizacional, comunitário e/ou institucional (Neumeier, 2012) que gera capital social e/ou cultural no enfrentamento de desafios sociais (Vercher et al., 2020). A inovação social resulta mudanças sociais por meio dos seus próprios atores sociais (Batista & Correia, 2021; Ibrahim, 2017).

À luz desse entendimento, em um padrão de escola inovadora, o autoconhecimento e a autoanálise guiam os estudantes em questões interdisciplinares, que desenvolvem neles, enquanto atores sociais, os próprios propósitos, interesses de pesquisa e de atuação no mundo, inclusive considerando questões sociais e ambientais.

Diante das reflexões apontadas, o tema leva a questionamentos sobre o processo em que a Educação produz a social (ou vice-versa) e como pode ser operacionalizado esse ciclo. Para uma maior compreensão, a literatura apresenta a perspectiva freireana de Educação (Freire, 1996) e as suas concepções sobre o uma educação que emancipe atores para a geração de IS.

Essa abordagem pedagógica de Paulo Freire trouxe, em sua teoria de aprendizagem transformativa, a perspectiva de uma educação voltada à conscientização e à emancipação, com aprendizagem baseada em problemas, participação e diálogo, desenvolvida em ambiente de aprendizagem cooperativa entre alunos e professores (Yee et al., 2019). Ademais, é preciso reforçar que, dentre as abordagens citadas, a que mais utiliza o entendimento de contexto social é a abordagem freireana.

Gerando libertação política e liberdade de expressão, a obra de Freire influenciou a área da educação de adultos com perspectivas críticas voltadas à formação de capacidade das pessoas atuarem em contextos sociais, políticos, culturais e econômicos (Yee et al., 2019). Esse fenômeno pode ser refletido em uma transformação da visão das pessoas, do mundo, das interações entre eles e dos ambientes que servem de cenário (Yee et al., 2019).

Como exemplo disso, trazemos à discussão as escolas inovadoras da série “Destino: Educação – Escolas Inovadoras” (Canal Futura), veiculada pela Globoplay, que têm em seus objetivos a geração de autonomia dos educandos, guiada por valores como respeito, solidariedade, responsabilidade, afetividade e honestidade, que se operacionalizam no que é chamado de aprendizado em atividades naturais da vida, que seriam de Educação não formal, porém aderidos pela Educação formal dessas escolas (brincadeiras, livros, computadores etc.).

Segundo o idealizador, a série apresenta escolas em várias partes do mundo que adotaram práticas e metodologias com o intuito de mostrar práticas educativas que objetivam o desenvolvimento do aluno em todas as dimensões da vida, desde a estruturação de novos moldes de ensino até o atendimento às demandas e questões despertadas pela sociedade contemporânea.

Especificamente, o Projeto Âncora, da cidade de Cotia/SP, é apresentado como um lócus de discussão contextual apropriado à temática. Além de estar situada no contexto brasileiro, a instituição possui novo molde de ensino, que se dividem em ciclos de aprendizagem. Nesse novo estilo, os alunos estudam juntos e aprendem por meio de pesquisas e projetos, sem salas de aula, muros e hierarquia, como defende o documentário (Globoplay, 2016). Assim, as práticas desse caso emblemático permitem a discussão do modo como a educação está associada à inovação social sob uma perspectiva freireana de aprendizagem transformativa. Relatos dos atores participantes dessas iniciativas, substanciados na literatura da temática, apresentam um recorte pedagógico importante para futuras aulas.

Defendemos que a temática apresentada neste caso envolve uma discussão interdisciplinar que integra a IS, gestão e políticas públicas de educação, em um delineamento teórico e empírico com caso prático do contexto macro brasileiro. Desse modo, o caso presente pode inspirar docentes e direcionar aulas em vários níveis do Ensino Superior em Administração, Gestão Pública, Pedagogia e cursos afins, em disciplinas que trabalhem diretamente as temáticas discutidas.

“Mamãe, tô passeando. Aqui também é escola!”

Raiou o dia, escovou os dentes e foi à escola. Mariana percebeu que aquele lugar em que sua mãe a deixaria boa parte de sua vida nem de longe parecia ser uma escola. Era, na verdade, um jardim, um lugar de passeio com os amigos, um templo de reuniões, um salão de jogos. Ela olhou em volta e perguntou-se: “Mamãe não está aqui, estou sozinha? Quem vai me dizer o que devo fazer?”.

Para sua surpresa, ninguém se propunha a ser seu superior, estava ali apenas para dar as mãos reciprocamente e apresentar um mundo de aprendizagem que prometeria ser a revolução. Mariana, então, começou a entender o que seria a inovação sem nem a saber nomear a princípio. Para ela, aquilo era diferente de tudo o que ela já tinha visto e das escolas pelas quais havia passado.

O Âncora é uma escola diferente, bem diferente do que a gente estava acostumado, porque ele preza bastante pela autonomia dos educandos. Então, a gente precisa ter os cinco valores, a gente trabalha em cima dos cinco valores, que são: respeito, solidariedade, responsabilidade, afetividade e honestidade (Mariana Feitosa – Educanda).

Todo o estranhamento e a surpresa de Mariana acontece porque na nova “casa” dela há propostas e práticas educacionais que podem estar associadas à inovação social, um fenômeno que traduz o ato de inovar buscando melhorias nas questões sociais. Esse aprendizado baseado em cidadania chamou a atenção da mídia e logo o Canal Futura decidiu criar um dos episódios do documentário “Destino: Educação – Escolas Inovadoras” (Globoplay, 2016) junto à escola de Mariana, o Projeto Âncora (Figura 1), de Cotia/SP. Foi aí que passamos a conhecer a história da Mariana e dos demais educandos, ou socioeducandos, que se beneficiam dessa iniciativa.

Figura 1: Vista de um dos espaços do Projeto Âncora
Figura 1: Vista de um dos espaços do Projeto Âncora
Fonte: Globoplay (2016).

Depois de um tempo de adaptação, Mariana aprendeu que é um caminho necessário o aprendizado sobre como lidar com o que é público e sua importância na sociedade. E a participação dela nesse espaço e seus feitos tornar-se-iam cada vez mais importantes. Ela percebeu que valia a pena estudar de modo diferente, que o conteúdo não é apenas o assunto científico, ou ainda melhor, que o assunto científico pode ser a visão social, pode ser o acontecimento do bairro, pode ser a horta que se cultiva, a pessoa que precisa de ajuda, a mudança política que ela precisa ver no mundo e, ainda mais urgente, na sua comunidade.

Nossa! Isso aqui vale a pena mesmo. Quero continuar aqui no ensino médio, ensino fundamental, vou colocar meus filhos aqui, porque foi quando eu vi, assim, que além de eu ter uma proximidade muito forte com a Língua Portuguesa, eu vi que isso estava fazendo sentido para mim. Todo dia a gente se surpreende, minha mãe se surpreende, eu me surpreendo comigo mesma, eu me surpreendo com meus colegas do tanto que a gente aprende aqui. Então, eu me sinto muito segura em relação ao Âncora e ao meu aprendizado (Mariana Feitosa – Educanda).

No Projeto Âncora, escola em que Mariana e seus colegas brincam, conversam, sorriem, passeiam, dialogam, lutam com seus ideais e consequentemente aprendem, suas colegas mais experientes, as coordenadoras pedagógicas Edilene e Claudia, explicam que elas também se surpreenderam com a materialização dos processos e dos resultados que vêm acompanhando na escola.

Edilene (Brito) explica que “a escola se organiza por núcleos de aprendizagem. Os núcleos são: iniciação, desenvolvimento e aprofundamento. E o critério de transição entre os grupos é o nível de autonomia conquistada nesse processo”. Entre esses níveis, há vidas, histórias, corações e tempos diferentes de aprendizagem. Há sobretudo pessoas que ali habitam e que, portanto, demandam e têm tutoria personalizada (Figura 2) e acompanhamento constante de tutores que elas mesmas escolhem. Afinal, a afinidade personaliza o aprendizado.

Figura 2: Tutoria personalizada
Figura 2: Tutoria personalizada
Fonte: Globoplay (2016).

A surpresa de Mariana com tamanha diferença na nova escola é legítima. Até suas colegas mais experientes – e aqui a palavra colega é enfatizada, porque a própria estrutura da escola é baseada na falta de hierarquia, na construção social da aprendizagem, na construção coletiva – dizem que passaram por um processo de adaptação e hoje acreditam em um ensino sem aulas tradicionais, em que o planejamento é feito com a participação do aluno. Claudia comenta que o tempo é um recurso fundamental em toda essa dinâmica, algo que é tão escasso para os adultos, mas que pode ser otimizado desde a infância.

Nós não fazemos para, fazemos com. Então, aqui a gente não planeja para o aluno, a gente planeja com o aluno. (...) Nós ensinamos, porque fazemos juntos, o aluno a planejar. Então, o aluno vai planejando, vai aprendendo a planejar o tempo dele, vai aprendendo a gerir o tempo, que é algo dificílimo. Parece fácil, mas não é, porque, para eu gerir meu tempo, eu preciso me conhecer (Claudia dos Santos - Coordenadora Pedagógica).

Segundo a concepção dos próprios atores da escola, sejam institucionais ou educandos, o foco do ensino é o atitudinal, é desenvolver em todos os participantes, em sentido irrestrito e coletivo, a capacidade de tomar atitudes significativamente válidas para o bem comum, para o desenvolvimento de pessoas com força de atuar na sociedade. Tudo isso se revela na condução das “aulas” não tradicionais, em lócus não utilizados comumente, como o jardim, a comunidade, a sala de jogos, a família e os espaços de convivência. Tudo pode ser útil à Educação. Edilene explica:

Temos crianças que estão na fase da alfabetização, da leitura, da escrita, da Matemática e das atitudes, porque nosso trabalho é pautado em atitudes e valores. É preciso entender quais são estes e como a gente interage com eles neste espaço. O tempo que elas permanecem na iniciação depende de cada uma, podendo ser uma semana, um mês, um ano, dois anos, três anos. Então, os educadores estão preparados para recebê-las e dar a elas o atendimento necessário, nesse âmbito coletivo, mas também na perspectiva individual. (...) Nós podemos aprender a lidar com o coletivo, aprender a lidar com o que é de todos de maneira responsável, solidária, honesta, para que a gente possa também, na sociedade, poder usar o banheiro público, poder usar o orelhão público. Para isso acontecer depende de nós. A gente precisa aprender a lidar com o que é público e isso a gente aprende aqui também (Edilene Brito – Coordenadora Pedagógica).

Mariana observa em toda a trilha da sua vida educacional que os discursos e as intenções são amplamente alinhados entre os envolvidos no projeto. Todos possuem a visão de que a construção da aprendizagem deve ser algo coletivo. De fato, isso acontece no caso. Ela aprendeu a respeitar o espaço e saber lidar com seus colegas. Ajudar é o verbo principal, todos são educandos e educadores, uma vez que, quando se fala em Educação:

(...) a gente não está falando de reprodução, a gente não está falando de prestar contas, a gente está falando de humanizar as pessoas, transformar o material humano numa qualidade relevante (...) a gente considera que qualquer um tem o direito de falar e qualquer um tem o direito de ser ouvido (Vitor Lacerda – Tutor).

Fósforo concorda com Vitor e explica a dinâmica de modo bem simples, mas significativo no processo:

No desenvolvimento, isso já está dado, né? Então, a criança que está lá, ela já tem que saber respeitar o espaço. Ela já tem que saber lidar com outra criança. Então, eles vão estar aprendendo de fato a questão do “alguém precisa de ajuda?”, “alguém levantou a mão?”, a criança vai. Não necessariamente o educador, porque quando uma criança ajuda a outra, ela está estudando também, né? Ela está sendo avaliada se ela consegue explicar. Ensinar a outra criança significa que ela está muito bem naquilo que ela está ensinando (Fósforo Quadros – Tutor).

Figura 3: Aula diferente com ajuda do jogo Sudoku
Figura 3: Aula diferente com ajuda do jogo Sudoku
Fonte: Globoplay (2016).

As aulas de Fósforo encantam Mariana, que nunca pensou que pudesse aprender Matemática e até mesmo outras disciplinas interligadas com ajuda de jogos, a exemplo do Sudoku (Figura 3), jogo que exercita a lógica humana em desafios de raciocínio cognitivo, e ainda conta com a interação dos colegas. O que é mais importante: vencer o jogo ou desenvolver minha cognição, aprender a interagir com meus colegas e aprender a aprender de diversas formas? Bem, os argumentos estão todos enumerados na segunda alternativa, e Mariana a segue.

As aulas são apenas uma das atividades desempenhadas no Âncora. Edilene busca continuamente mostrar à Mariana e seus demais colegas que escola é espaço de decisão, é espaço de atuação, de discussões políticas, no sentido mais nobre e técnico da palavra. É um espaço de convivência e de assimilação generalizada de conteúdo. Mariana, nossa personagem principal que representa os demais em patamar de igualdade, continua sua jornada de descoberta e de encantamento com tudo que está aprendendo. Não bastava ter aulas diferentes, aprender com jogos, ela agora tinha poder, um poder formado a partir do grupo, ela sente-se à frente do seu tempo e importante no seu espaço. Isso despertou curiosidade e necessidade de aplicar tudo que aprendeu em seus espaços de vivência. Mas, antes, vamos entender o que Edilene tem a dizer para Mariana e para nós.

Essas reuniões pra decisões de coisas simples e também coisas complexas do projeto, todas elas nós buscamos o envolvimento de todas as crianças, porque, se a gente está falando de pessoas, está falando de preparação dessas pessoas para mudança social, para transformação social, então temos que começar aqui no nosso dia a dia. Como ela vai participar politicamente das decisões do seu bairro se ela não participa politicamente das decisões da sua escola? Então, o que a gente busca é isso, essa formação política. Então, ela começa a olhar para o mundo de maneira diferente. Não com o olhar da queixa e “que não fizeram pra ela”, mas “qual foi meu papel? qual é o meu papel nessa melhoria? Nessa mudança?”. Primamos muito pelos encontros, pelas assembleias, pelas rodas de reflexão, pelas decisões coletivas, porque é daí que nós estamos buscando esse cidadão que queremos para nossa sociedade (Edilene Brito – Coordenadora Pedagógica).

Mariana reflete sobre o que Edilene, pessoa com bem mais experiência que ela, tem a falar sobre a vida, a Educação e a formação dela enquanto ser político e chega à conclusão de que não é somente dentro de quatro paredes que vai conseguir com total efetividade melhorar sua comunidade (Figura 4). Então, como? O tutor Marcel explica que Mariana está correta. É preciso desbravar, conhecer e integrar todos os locais que frequentamos e que buscamos como escola.

Além de dar conta do cognitivo, da aprendizagem, de conteúdo, o que a escola faz ou tenta fazer, é não ficar na escola, é sair, ir para o bairro, para a comunidade, trabalhar fora dela, envolver outras pessoas dentro da escola e se envolver fora da escola. Vejo que o objetivo é que a escola seja só uma referência, mas não é necessário estar na escola para estudar, não é necessário estar na escola para aprender ou se relacionar. A gente está num momento em que isso ainda é necessário, a gente faz isso aqui dentro, mas o objetivo é cada vez mais isso se diluir, que a comunidade vire uma grande escola (Marcel de Sena – Tutor Especialista em Matemática).

Figura 4: Visita à comunidade
Figura 4: Visita à comunidade
Fonte: Globoplay (2016).

Era só uma escola que os pais de Mariana buscavam, mas acharam um portal para a vida. Mariana segue sua trilha aprendendo e ensinando a eles o que aprende. Suas pretensões futuras enquanto criança são mais do que ter uma profissão. Em diversos campos de ensino, ela aprende como ser uma agente de transformação social. Cada vez mais, essa responsabilidade é incluída na formação dos educandos, ou como chamam, “socioeducandos”, e, com isso, há o empoderamento, a visão crítica e a participação mais efetiva e contributiva dos envolvidos (Figura 5).

Figura 5: Voz ativa e participação dos educandos
Figura 5: Voz ativa e participação dos educandos
Fonte: Globoplay (2016).

Tudo que ocorre no Projeto Âncora provém de uma gestão alinhada com os princípios da inovação social, mesmo que indiretamente, uma vez que possui os pilares básicos do fenômeno, já elencados no decorrer do texto. A criança cresce com aprendizados básicos por meio de uma Educação ampla e voltada para o que pode ser chamado de seu projeto de vida.

Nós buscamos aqui no projeto uma gestão horizontal, mas a gente sabe que não se sai de um lugar e vai para o outro num passe de mágica. É preciso criar andaimes, né. A equipe está o tempo todo pensando e repensando como que a gente pode gerenciar este espaço, dar conta das questões burocráticas, das questões administrativas, das questões pedagógicas, mas em equipe, não de uma maneira hierárquica, onde a solução venha de cima pra baixo, mas que todos, sim, sejam responsáveis por todas as questões desse projeto, inclusive as famílias através da associação de pais (Edilene Brito – Coordenadora Pedagógica).

Para entender melhor, contamos mais uma vez com Edilene, que explica de maneira objetiva e exemplificada como se dá a Educação para a inovação social. Mariana, Edilene, Vitor, Fósforo, Claudia e todos os demais envolvidos no projeto têm grande papel nessa jornada, que culmina com a motivação, o engajamento e a vontade de ver no mundo um lugar melhor para se viver, utilizando, para isso, ferramentas do conhecimento e sentimento de bem-estar coletivo.

Quando a criança apresenta um desejo, uma necessidade, um sonho, né, que é de onde a gente parte, ali a gente começa a fazer uma investigação. Por que é que você quer? Por que você quer acabar com o lixo no mundo? O que te incomoda? Mas como é que a gente acaba com esse lixo no mundo? Começamos por onde? O que você já sabe sobre isso? E depois começamos a responder o questionamento, que é o que quero, por que quero, com quem vou fazer, quanto tempo vou precisar, né? Quais os materiais, os recursos que vou ter que ter disponível para eu realizar esse trabalho? E o que eu tenho que aprender, basicamente. Então, a partir daí, o que eu tenho que aprender... A gente vai navegar pelas áreas do conhecimento. Então, as áreas do conhecimento, Português, Matemática, História e Geografia vão ter um sentido, um significado nesse processo, não vão ser conhecimentos isolados, ilhados e que vão ser esquecidos porque não fazem sentido. Então, a busca é pelo significado da aprendizagem (Edilene Brito – Coordenadora Pedagógica).

O Estado nem sempre consegue suprir o que precisamos e poucos são os sujeitos que pensam coletivamente. No entanto, são muitas Marianas atendidas pelo projeto e são muitos novos integrantes de uma sociedade mais justa, mais política e mais adequada a nossa realidade. Isso traz a reflexão de que a Educação é um instrumento operacionalizador em suas mais múltiplas facetas. José, o padrinho indireto de Mariana, discorre sobre o mundo em que ela entrou há algum tempo e já faz parte de sua vida.

Nós estamos em uma instituição que eu poderei qualificar de inovadora. E quando se fala de inovação, nós teremos de pensar na definição do conceito de inovação. Inovação é tudo que é inédito, que é novo e que aporta, de algum modo, qualidade, melhoria, benefício, utilidade. Isso já distingue o Projeto Âncora daquilo que é considerado de um modo geral como inovação. Não é inovação dar um laptop a cada aluno. Não é inovação substituir o quadro por uma lousa digital. Não é inovação passar de ano para ciclo, de ciclo para ano. Não é inovação melhorar as aulas. Uma aula não deve ser melhorada, uma aula deve ser erradicada. Onde há aula, não há inovação. Então, o que é preciso fundamentalmente mais do que, enfim, todas essas modificações, que são apenas paliativas é conceber e desenvolver uma nova construção social de aprendizagem, porque a arte, a profissão de professor, não é um ato solitário, é um ato solidário. Não estamos condenados a uma profissão de solitários em sala de aula. E solitário não é autônomo. Nós só somos autônomos com os outros, em equipe. Considerar realmente que nem tudo passa pelo cognitivo, passa pelo atitudinal. É isso, pela emoção, pelo afeto, pela ética, pela estética, e até pelo espiritual, se quiser (José Pacheco – Coidealizador da Escola Projeto Âncora).

Observando a trajetória de Mariana, podemos dizer que a Educação gera/produz inovação social? O que é inovação social? A inovação social também dá apoio à Educação? Claudia traz uma fala que pode ajudar nessa compreensão. É possível incrementar o ensino com elementos de inovação?

Você já viu plataforma de ensino? Então, a gente ousou construir uma de aprendizagem e não de ensino. Então, nessa plataforma tem tudo o que precisa de registro, de orientação, de organização, tudo, tudo, para que educando e educador possam se relacionar e que a avaliação realmente seja formativa, contínua e sistemática, que é a nossa avaliação, que é a avaliação que a lei LDB [Lei de Diretrizes Básicas da Educação] fala, mas que pouca gente sabe aplicar. Aqui não, ela realmente acontece no processo. E, para a gente, como tudo é aprendizagem, tudo também é avaliação, porque avaliação é sinônimo, para a gente, de aprendizagem (Claudia dos Santos - Coordenadora Pedagógica).

Bem, podemos discutir sobre esse ciclo de autoapoio entre inovação social e Educação. Elementos e práticas já temos em mãos e até mesmo exemplo de tecnologia social, mas vamos aos poucos, por hoje aprendemos muito e Mariana está cansada. Foi dormir, porque o dia foi cheio. Agora, a mãe dela pode perguntar-se o que sua filha aprendeu e ela pode responder a si mesma: aprendeu a viver, aprendeu que em uma aula deve entender qual é o seu papel no mundo, na sociedade e, mais precisamente, na comunidade em que está inserida. Ou será que Mariana vai ensinar isso a sua mãe, que provavelmente não teve o mesmo ensino que ela? É possível ter uma Educação para inovação social e/ou ter a ajuda de inovadores sociais na Educação? E aí, o que vocês acham?

NOTAS DE ENSINO

Objetivo do Caso

A inovação social vinculada aos ecossistemas educacionais, liderados por todos os tipos de instituições educacionais, aproximam a Educação formal das comunidades e da sociedade civil como um todo (Giesecke & Schartinger, 2021). Suas características e discussões pairam sobre atores sociais bem definidos: atores educativos tradicionais e “não tradicionais” – movimentos sociais e sociedade civil, empreendedores sociais e organizações não-governamentais (ONGs).

Esses atores empreendem esforços para a criação de soluções inovadoras com a intenção de satisfazer necessidades sociais não atendidas no âmbito da Educação, empoderando pessoas e criando estruturas sociais e de práticas (Giesecke & Schartinger, 2021). Nesse cerne, é importante dizer que a colaboração dos atores nos processos abre portas para a diversidade.

Salas de aula formais e informais integram alunos de diferentes idades, origens, etnias, capacidades de aprendizagem e visões de mundo, dentre outros aspectos. Tem-se, então, uma aprendizagem com maior possibilidade de desenvolvimento de empatia, tolerância, e, por conseguinte, habilidades sociais (Giesecke & Schartinger, 2021).

Com esse entendimento, este caso para ensino tem o objetivo de discutir a relação entre educação e inovação social, a partir de um dos episódios da série brasileira de documentários “Destino: Educação – Escolas Inovadoras” (Canal Futura), veiculada pela Globoplay (2016). Por meio do episódio “Projeto Âncora - Cotia/SP”, em função das características inovadoras da escola em destaque no contexto brasileiro, podemos refletir sobre a associação entre educação e inovação social.

Como fonte de dados, a série idealizada pelo Canal Futura em parceria com o Serviço Social da Indústria (SESI Nacional), apresenta 13 episódios de 52 minutos em média. Com consultoria pedagógica do Porvir, do Instituto Inspirare e produção da Cinegroup, a obra dirigida por Márcio Venturi retrata escolas de várias localidades, como Curitiba e Manaus (Brasil), Rosário (Argentina), Cusco (Peru), Redwood City (EUA), Ottawa (Canadá), Barcelona (Espanha), Pulheim (Alemanha), Hadera (Israel), Vaatsa (Estônia), Sidney (Austrália) e Bali (Indonésia) (Futura, 2018).

Suportada pela literatura, esta análise, contribui com o dilema da geração da inovação social por meio da educação e vice-versa, tendo o potencial de estimular o ensino e a prática de novos tipos de educação, de gestão e de se pensar a sociedade. A partir da leitura e das atividades propostas, gera-se um vínculo entre a gestão e política pública da educação e a sociedade, lançando mão de artifícios teóricos e práticos sobre inovação social e as ferramentas que a compõem/circundam. Nesse entremeio, educadores/gestores escolares podem tornar o debate mais desafiador, acrescentando questões de vivências próprias e consolidando o caráter colaborativo do tema, o que intensifica o atingimento do objetivo deste caso para ensino.

Aspectos pedagógicos

Para o início da aula, é necessário organizar o conteúdo em etapas, uma vez que o tema articulado é novo na maioria das discussões acadêmicas. Desse modo, sugerimos dividir sua ministração em quatro etapas. No 1º encontro, sugerimos a apresentação da teoria sobre inovação social e suas aplicações/congruências com a Educação na literatura e a literatura sobre Educação sugerida no guia teórico deste caso: conceituações, aplicações gerais dos temas e específicas, atores e práticas e a discussões contextual do fenômeno. Essa aula pode explorar mais profundamente o guia teórico deste caso.

No segundo encontro, após breve introdução sobre o tema discutido na aula anterior, apresenta-se o episódio 1, “Projeto Âncora – Brasil”, da terceira temporada da série “Destino: Educação – Escolas Inovadoras”, com o foco nas escolas brasileiras, uma vez que a variável contexto seja decisiva no estudo da inovação social. Sugerimos que o docente faça pausas durante a exibição do documentário para que articule a teoria com a apresentação das práticas, bem como indique aos alunos que opcionalmente reassistam o episódio em outro momento.

Após isso, apresenta-se uma explanação e exemplos da localidade em que o professor/aluno está inserido, acrescidos das vivências e experiências dos alunos. Pode-se fomentar comparações entre os casos, bem como entre os casos explanados e a literatura. Alguns questionamentos podem guiar esse segundo momento: Há inovação social nesses casos? O que ela pode oferecer de vantagem para a Educação?

No terceiro encontro, espera-se que os alunos já possuam conhecimento basilar para discutir sobre as aplicações da Educação para a inovação social e o debate seja intensificado e conte com o entendimento da operacionalização dos processos, por meio do framework (ciclo) apresentado ainda nessa seção.

No quarto encontro, o professor pode apresentar uma retomada do conteúdo abordado e realizar um seminário em grupos para discussão do que foi debatido até então, trazendo à tona uma nova camada de discussão para o assunto, norteada pela seguinte reflexão: Observou-se a geração de inovação social por meio da Educação, no entanto, em que aspectos, processos, práticas podemos observar a retroalimentação do ciclo? A inovação social também gera Educação? Como?

Ainda no quarto encontro, pode ser feito o preenchimento do modelo já discutido com práticas de escolas conhecidas pelos alunos, o que possibilitará a análise do fenômeno na prática, a classificação dos processos e a visão crítica sobre os processos educacionais em diferentes contextos.

Para aulas mais curtas, os quatro momentos podem ser apresentados de forma resumida, desde que os alunos sejam informados em aula anterior que devem pesquisar e trazer questionamentos sobre o tema e preparar seminários curtos para o momento devido. Sugerimos focar na aplicação do tema, fazer com que os alunos entendam que, por mais nova que seja a discussão teórica em alguns sentidos, o que é discutido é visto na prática e pode nortear de forma benéfica a Educação.

Para isso, o professor ou a professora tem papel importante de mediador, provocando nos alunos a visão crítica que os temas demandam. Recursos didáticos como lousa, slides, quadro, construção de mapa mental, debates simples ou formulados a partir de grupos podem ser usados nos momentos indicados. Nesse sentido, a participação é fundamental, a voz dos sujeitos, as contra-argumentações e a capacidade de absorção de conteúdo, vistas por meio de respostas fundamentadas, contextualizações, questionamentos intrigantes e reflexões sobre as vantagens das práticas em suas formações e na sociedade. Avaliações podem ser feitas individualmente, por meio de redações abertas, ou em grupo, em conjunto com as avaliações grupais.

Questões para Debate

1. Na escola de Mariana, há uma Educação para a inovação social?

2. Entendendo as últimas falas de José e Claudia sobre inovação, como podemos entender o que de fato é um ensino inovador e as contribuições da inovação social para a Educação?

3. O que o ensino chamado por Edilene de “atitudinal”, voltado para a mudança social, provoca nos alunos?

4. Mariana está surpresa com a sua aprendizagem na escola. Segundo ela, a palavra-chave é autonomia. Você conhece escolas ou espaços semelhantes? Quais são os elementos dessa(s) escola(s) que remetem à inovação social como produto da Educação e como um suporte para essa prática?

5. “Estou no Brasil?”: O contexto brasileiro é propício para a educação para inovação social?

GUIA TEÓRICO PARA ANÁLISE

A Escola Inovadora e Suas Inspirações

Diante de um cenário de desigualdade e de vulnerabilidade social, em que o Estado não supre todas as necessidades (Helal & Rocha, 2013), a Educação é um vetor de redução das desigualdades sociais (Loogma et al., 2013; Pocklington & Wallace, 2014; Schröder & Krüger, 2019), podendo ser alvo de práticas de gestão social em complemento à administração pública. Nesse pensamento, os sistemas educacionais nem sempre conseguem contribuir efetivamente com a inovação social e o consequente combate às desigualdades, muito em função de projetos pedagógicos inadequados e de processos burocráticos com entraves, que impedem o funcionamento de uma educação emancipadora, voltada para a inovação social (IS) (Cajaiba-Santana, 2014; Correia et al., 2019; Loogma et al., 2013; Ziegler, 2017).

Para responder à primeira questão, tem-se que, diferentemente da inovação puramente tecnológica (Engelbrecht, 2017), a inovação social age como solução inovadora de vários atores sociais, principalmente atores de base (Batista & Correia, 2021; Ibrahim, 2017), para os problemas sociais (Cajaiba-Santana, 2014), nas formas de processo e/ou produto (Neumeier, 2012), sendo diretamente relacionada a determinado contexto em que se insere (Lubelcová, 2012; Voltan & De Fuentes, 2016). Esse fenômeno traduz-se em estruturas alternativas de governança (Galego et al., 2021; Unceta et al., 2017) e/ou corporativas, que têm como objetivo a mudança social (Portales, 2019; Schubert, 2018; Van der Have & Rubalcaba, 2016), o que está presente no Projeto Âncora, caso apresentado para análise.

Framework sobre a relação entre Educação e inovação social

A segunda questão sugerida traz à tona a operacionalização da relação entre Educação e inovação social. A literatura sobre essa congruência possibilita um amplo debate sobre as inovações educacionais, uma vez que a Educação é o ponto de início para a produção de inovação social. As duas frentes juntas podem ser consideradas como uma abordagem resolutiva para questões sociais, por meio de métodos criativos, eficazes, colaborativos e inovadores (Chow et al., 2019).

Do mesmo modo que a Educação consegue incorporar a inovação social ao seu escopo, a recíproca é verdadeira. Existe um processo de retroalimentação no qual esta se apresenta como tecnologias sociais (Brisola et al., 2020; Dagnino, 2014) e/ou políticas públicas favoráveis às políticas e práticas educativas. Os autores Duque e Valadão (2017) concebem as tecnologias sociais como construções comunitárias que possuem o objetivo de resolução de problemas sociais, econômicos e/ou ambientais com a inclusão social dos envolvidos (Duque & Valadão, 2017). Esse estudo corrobora o pensamento desses autores, reafirmando o argumento de que as tecnologias sociais são ferramentas para a inovação social e, portanto, também podem incorporar o escopo da inovação social para amparar a educação (e vice-versa).

As iniciativas são as mais variadas, como um exemplo advindo da própria literatura: as empresas sociais chamadas de InterBoxes, que Chow et al. (2019) defendem que contribuem para o desenvolvimento de novas tecnologias voltadas à facilitação do acesso à Educação, por meio de caixas de acesso à internet e bibliotecas móveis para estudantes na China rural. Além desse, existem vários outros exemplos na literatura. Vide referências.

A partir da articulação apresentada, o ciclo a seguir (Figura 6) consegue representar a operacionalização entre Educação e inovação social.

Figura 6: Framework – Operacionalização da educação em consonância com a inovação social
Figura 6: Framework – Operacionalização da educação em consonância com a inovação social
Fonte: Elaborado pelos autores (2022).

Tem-se como argumento central do framework (ciclo) apresentado: a Educação é fonte de inovação social, que a retroalimenta, dependendo de sua configuração e contexto. Toda a dinâmica dá-se por meio de políticas e de práticas educacionais, além de práticas da Educação não formal, sendo guiadas por uma espécie de aprendizagem transformativa. Os resultados desses processos são a emancipação de atores sociais, as soluções multiagentes e inovadoras para a mudança social e a melhoria da Educação também como fim. Os tópicos a seguir apresentam a discussão que fundamenta o modelo proposto.

Inovação Social e sua Aplicação na Educação

Para responder à terceira questão, tem-se o entendimento do fenômeno chamado de inovação social, em que atores sociais se engajam em ações voltadas ao bem-estar coletivo (Correia et al., 2019; Gerometta et al., 2005; Portales, 2019), que envolvem mecanismos de governança como a aprendizagem e o empoderamento dos próprios participantes (Correia et al., 2019; Windrum et al., 2016). Devido a sua amplitude, faz-se presente nos âmbitos organizacional, comunitário e/ou institucional (Neumeier, 2012).

A inovação social tem um conceito formado a partir de várias colaborações e propósitos (Ziegler, 2017). Nesse sentido, pode ser entendida a partir de duas perspectivas: a visão institucional, que a concebe como fruto da interação entre atores sociais mobilizados; e a visão estruturalista, que a compreende como um esforço coletivo de ações para resultados sociais controlados (Cajaiba-Santana, 2014).

No entanto, o fenômeno não se constitui necessariamente apenas em auto-organização civil, dado o fato de que algumas narrativas também mencionam a necessidade de apoio público (Vercher et al., 2020). O setor público, por exemplo, propicia a troca de conhecimentos entre as comunidades do setor rural por meio de capacitação, atividades de coaprendizagem e de cocriação, fornecendo a conexão indistinta do ambiente sociopolítico (Vercher et al., 2020).

Em relação à difusão da inovação social, existe a necessidade de novas narrativas para que haja o surgimento e a adesão de atores sociais. Essas narrativas, que representam as identidades das iniciativas, devem ser coesas e contundentes e provocar a chamada ativação da comunidade, com vista à redução dos desequilíbrios nas relações de poder (Vercher et al., 2020). Também devem traduzir as interações entre os atores, as transformações sociais pretendidas e as autotransformações, a exemplo dos processos educacionais refletidos na aprendizagem dos envolvidos, o que demonstra uma aproximação natural entre a inovação social e a Educação.

Abre-se o campo, então, para uma articulação entre a inovação social e a Educação enquanto área do conhecimento, no sentido de inspirar práticas educacionais em contribuições teóricas e empíricas. Nesse sentido, debates ou projetos em várias camadas da sociedade, inclusive em ações comunitárias (Moulaert et al., 2007), fortalecem o alcance da transformação social (Cajaiba-Santana, 2014; Portales, 2019; Van der Have & Rubalcaba, 2016), em detrimento de uma inovação meramente tecnológica. Uma discussão cabe agora sobre como devemos entrelaçar, de maneira eficaz, esses caminhos.

Aprofundando ainda mais a discussão que surge com a terceira questão, discute-se que a articulação entre Educação e inovação social ainda não é muito presente na literatura e está baseada na necessidade de abordagens sistemáticas sustentáveis que ajudem na transformação social e na consequente melhoria da sociedade (Gurrutxaga Abad & Galarraga Ezponda, 2019; Alden Rivers et al., 2015; Biggeri et al., 2017). Internamente, perspectivas mais críticas na promoção e integração de todas as partes interessadas resultam em um processo educacional emancipatório (Santos, 2019; Schröder & Krüger, 2019).

A práxis da Educação para inovação social

Para responder à quarta questão, pode-se apresentar elementos práticos previstos pela literatura apenas como base para que os alunos busquem novos exemplos. Pensar em como aproximar de maneira prática a inovação social e a Educação é o desafio. A Educação não formal e no educador social podem ser enraizadas no pensamento da tríade proposta por Paulo Freire (1996): curiosidade ingênua, criticidade e curiosidade epistemológica. Desenvolver esses pilares gera o pensamento dialético, diálogo entre ideias conflitantes; a práxis, a prática das ideias; e a dialogicidade, os resultados surgidos da convergência de diálogos. Nesse contexto, há uma coexistência de lógicas rivais que dimensionam a inovação social (Voltan & De Fuentes, 2016).

Num sistema educacional, a inovação social pode ser fortalecida a partir dos esforços de atores de diferentes segmentos da sociedade: educadores, governo, sociedade civil e empresas (Bellandi et al., 2021), o que corrobora o conceito de quadrupla hélice de produção de conhecimento de Carayannis e Campbell (2009) e o laço entre conhecimento e inovação de Schröder e Krüger (2019). Nesse âmbito, esse tipo de inovação percorre tanto a Educação formal quanto outros loci não formais. Isso se deve à aprendizagem baseada em cocriação e codesenvolvimento (Windrum et al., 2016).

Nessa vertente, há uma reflexão para a resposta da quinta questão. A ênfase recorrentemente atribuída ao contexto é significativa quando se quer entender de que forma os processos discutidos por este caso são realizados. Um exemplo brasileiro, dentre tantos outros, é a Educação no campo, na qual o aluno vivencia a aprendizagem da base curricular somada ao desenvolvimento sustentável que o campo pode oferecer, em consonância com as necessidades da comunidade, neste exemplo, de contexto amazônico (Andrade & Valadão, 2020). Andrade e Valadão (2020) defendem que, nesse tipo de aprendizagem, a juventude é formada a partir da própria vivência do campo aliada a aspectos humanos, intelectuais, profissionais, sociais e até mesmo espirituais.

Na dimensão formal, há o exemplo das instituições de Ensino Superior (Monteiro et al., 2021). Essas instituições desenvolvem pesquisas relacionadas ao conhecimento emergente da sociedade, e podem ser amplamente úteis ao desenvolvimento comunitário (Bellandi et al., 2021). Debates contemporâneos defendem, inclusive, mudanças nos currículos dos cursos de Ensino Superior com vista a uma compreensão do papel social, da colaboração interdisciplinar e dos impactos sociais e ambientais. Há um esforço de algumas instituições na formação de alunos com princípios basilares humanistas, guiados pelo conhecimento, pela criatividade e pela inovação, objetivando o bem-estar social e o desenvolvimento sustentável (Monteiro et al., 2021).

Nos novos currículos, estão previstos processos participativos e de responsabilidade social em uma aprendizagem exploratória (Nunes, 2017; Vodeb, 2015). Nessa lógica de funcionamento, existem os chamados laboratórios de aprendizagem e de inovação aberta - ambiente de aprendizagem em que os indivíduos pensam, discutem e aprendem juntos (Gómez Zermeño & Alemán de La Garza, 2020); os cursos abertos a distância (EAD), com fóruns interativos que formam discussões sobre o pensamento comunitário (Siddike & Kohda, 2016) – ressalvados os contextos de falta de acesso à internet por alguns estudantes (Reveley & Peters, 2016); as redes de inovação social e o design social, um modelo alternativo de Educação por meio de projeto para organizações profissionais (Easterday et al., 2018).

Cada lócus educacional terá suas especificidades, tendo a quinta questão proposta várias lentes para análise dos fenômenos aqui discutidos. Nas diversas perspectivas, o contexto é o fator-chave para a definição de práticas a serem adotadas. As aplicações da Educação para inovação social devem ser frutos das conjunturas social, econômica e política da localidade (Lubelcová, 2012; Monteiro et al., 2021). Sociedades com baixo nível de bem-estar, por exemplo, revelam barreiras impostas à colaboração, o que demanda atores mais desafiadores em relação às estruturas (Bozic, 2020).

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