Neoconservadorismo e agenda antigênero em políticas de educação no Brasil:

uma análise com foco na BNCC do ensino médio

Autores

DOI:

https://doi.org/10.47328/rpv.v13i2.16829

Palavras-chave:

Neoconservadorismo, Gênero e Sexualidade, Base Nacional Comum Curricular (BNCC)

Resumo

O artigo investiga a mobilização da agenda antigênero no campo das políticas da educação básica do Brasil. Em específico, o presente texto tem por objetivo analisar as alterações nas versões da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) da etapa do Ensino Médio (EM), em torno da perspectiva de gênero e sexualidade. As sucessivas redações da BNCC foram construídas em meio a uma crise democrática, marcada pela ascensão da extrema direita ao poder e pela aliança entre neoliberalismo e conservadorismo moral, cujos impactos foram sentidos em todo o tecido social. Nesse contexto, a esfera da educação foi palco de disputas acirradas, de propagação de pânico moral e de perseguição a docentes. As recentes reformas da educação básica e a reformulação dos documentos que norteiam o ensino no país expressam em muito a coalizão entre forças neoliberais e neoconservadoras. Observa-se na última versão da BNCC um novo arranjo em torno do papel da família, assim como a supressão dos enfoques sobre gênero e sexualidade nos itinerários formativos de todas as áreas do conhecimento. A pesquisa documental realizada aponta para o predomínio de temas genéricos que não impossibilitam o trabalho docente sobre os marcadores. Em contrapartida, ao não tratarem discursivamente dos enunciados, tais documentos reiteram narrativas morais de silenciamento e reforço da cisheteronormatividade como único modo de se viver as relações de gênero e sexualidade.

Downloads

Não há dados estatísticos.

Biografia do Autor

Carolina Vergara Rodrigues, Instituto Federal Sul-rio-grandense (IFSul)

Licenciada e Mestra em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Pelotas. Doutoranda em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Professora de Sociologia do Instituto Federal Sul-rio-grandense (IFSul). 

Fernando Seffner, Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)

Doutor em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Professor do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Coordenador do GEERGE.

Referências

AGUIAR, M. A. S.; TUTTMAN, M. Políticas educacionais no Brasil e a Base Nacional Comum Curricular: disputas de projetos. Em Aberto, Brasília, v. 33, n. 107, p. 69-94, jan./abr. 2020.

AUGUSTO, L. Ministra diz que governo vai criar canal para denunciar professor que atente 'contra a moral'. ESTADÃO. Educação. 19 set. 2019. Disponível em: https://www.estadao.com.br/educacao/ ministra-diz-que-governo-vai- criar-canal-para-denunciar-professor-que-atente-contra-a-moral/. Acesso em: 18 ago. 2023.

BERCHT, G; C. E. BARZOTTO. A infância sem pornografia e o movimento antigênero: aproximações conceituais. Margens, v. 16, n. 26, p. 73-94, 2022.

BIROLI, F. Gênero, “valores familiares” e democracia. In: BIROLI, F; MACHADO, M. D. C; VAGGIONE, J.M. Gênero, neoconservadorismo e democracia. São Paulo: Boitempo, 2020. P.135-188.

BRASIL. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Combate à Discriminação. Brasil Sem Homofobia: Programa de combate à violência e à discriminação contra GLTB e promoção da cidadania homossexual. Brasília: Ministério da Saúde, 2004. Disponível em: https://bvsms. saude.gov.br/bvs/publicacoes/brasil_sem_homofobia.pdf. Acesso em: 18 ago. 2023

________. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. 1ª Versão. Educação é a base. Brasília: MEC, 2015. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/ relatorios-analiticos/BNCC-APRESENTACAO.pdf. Acesso em: 18 ago. 2023

________. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. 2ª Versão. Educação é a base. Brasília: MEC, 2016a. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/ relatorios-analiticos/bncc-2versao.revista.pdf. Acesso em: 18 ago. 2023

________. Ministério da Educação. Relatório – Síntese da contribuição dos estados. Brasília: MEC, 2016b. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/relatorios-analiticos/ Relatorios-Sintese%20dos%20Estados.pdf. Acesso em: 18 ago. 2023

________. Lei nº 13.415, de 16 de fevereiro de 2017. Altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 17 fev. 2017. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015- 2018/2017/Lei/L13415.htm. Acesso em: 18 ago. 2023.

_______. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. 3ª Versão. Educação é a base. Brasília: MEC, 2018a. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/ historico/ BNCC_EnsinoMedio_embaixa_site_110518.pdf. Acesso em: 18 ago. 2023.

________. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Portaria n° 1.348. Diário Oficial da União: 17 dez. 2018b, Seção 1, Pág. 33. Disponível em: http://basenacionalcomum. mec.gov.br/abase. Acesso em: 18 ago. 2023

BROWN, W. Nas ruínas do neoliberalismo: a ascensão da política antidemocrática no ocidente. São Paulo: Editora Filosófica Politeia, 2019.

CELLARD, A. A análise documental. In: POUPART, Jean. A pesquisa qualitativa: enfoques epistemológicos e metodológicos. Petrópolis: Vozes, 2008.

CHAUÍ, M. Democracia: criação de direitos. Síntese, Belo Horizonte, v. 45, n. 143, p. 409-422, set./dez. 2018a.

CHAUÍ, M. Em defesa da educação pública, gratuita e democrática. Belo Horizonte: Autêntica, 2018b.

CNDE. Ação no STF questiona uso do Disque 100 para perseguição política. 2022. Disponível em: https://campanha.org.br/noticias/2022/02/10/acao-no-stf-questiona-uso-do-disque-100- para-perseguicao-politica/. Acesso em: 18 ago. 2023.

COLLINS, P. H. Bem mais do que ideias: a interseccionalidade como teoria social crítica. São Paulo: Boitempo, 2022.

COOPER, M. Family Values: between neoliberalism and the new social conservativism. New York: Zone Books, 2017.

FOUCAULT, M. A arqueologia do saber. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2005.

FOUCAULT, M. História da Sexualidade I: a vontade de saber. São Paulo: Graal, 2007.

FURLANI, J. A narrativa ‘ideologia de gênero’: impactos na educação brasileira e nas políticas de identidade. In: SEFFNER, Fernando; FELIPE, Jane (Orgs.). Educação, gênero e sexualidade. Petrópolis, RJ: Vozes, 2022. P. 335-361.

GOMES, Robert Moura Sena. Por uma linguística (mais) popular: a construção do gênero neutro como dissidência linguística. 2022. Dissertação (Mestrado em Linguística) – Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2022. Disponível em: https://repositorio.ufscar.br/handle/ufscar/16586. Acesso em: 18 ago. 2023.

IBGE. Censo 2022. Divulgação dos Resultados. Disponível em: https://censo2022.ibge.gov.br/etapas/divulgacao-dos-resultados.html. Acesso em: 04 out. 2023

JUNQUEIRA, R. ‘Ideologia de Gênero’: a gênese de uma categoria política reacionária – ou: a promoção dos direitos humanos se tornou uma “ameaça à família natural?”. In: RIBEIRO, P. R. C.; MAGALHÃES, J. C. (Orgs.). Debates contemporâneos sobre Educação para a sexualidade. Rio Grande: Ed. FURG, 2017. P. 25-52.

JUNQUEIRA, R. D. A invenção da “ideologia de gênero”: a emergência de um cenário político-discursivo e a elaboração de uma retórica reacionária antigênero. Psicologia Política, n. 18, v. 43, p .449-502, 2018. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid

=S1519-549X2018000300004&lng=pt&nrm=iso. Acesso em: 18 ago. 2023.

LAVAL, C.; VERGNE, F. Educação democrática: a revolução escolar iminente. Petrópolis: Vozes, 2023.

LEVITSKY, S.; ZIBLATT, D. Como as democracias morrem. Rio de Janeiro: Zahar, 2018.

LOURO, G. L. Gênero, sexualidade e educação: uma perspectiva pós-estruturalista. 16 ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2014.

MACHADO, M. D. C. O neoconservadorismo cristão no Brasil e na Colômbia. In: BIROLI, F; MACHADO, M. D. C; VAGGIONE, J. M. Gênero, neoconservadorismo e democracia. São Paulo: Boitempo, 2020. P. 83-133.

MARCONI, M.; LAKATOS, E. M. Fundamentos de Metodologia Científica. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2003.

MAZUI, G.; KLAVA, N. Bolsonaro diz que questões do Enem 'começam agora a ter a cara do governo'. 15 nov. 2021. Disponível em: https://g1.globo.com/politica/noticia/2021/ 11/15/ bolsonaro-diz-que-questoes-do-enem-começam-agora-a-ter-a-cara-do-governo.html. Acesso em: 18 ago. 2023.

MIGUEL, L. F. Da “doutrinação marxista” à “ideologia de gênero” – Escola sem Partido e as leis da mordaça no Parlamento brasileiro. Revista Direito & Práxis, Rio de Janeiro, v. 7, n. 15, p. 590-621, 2016.

MIGUEL, L. F.; OLIVEIRA, M. Pânico moral e ódio à diferença: a estratégia discursiva do 'Escola Sem Partido'. Revista Sul-americana de Ciência Política, v. 6, p. 261-278, 2020.

MOUNK, Y. O povo contra a democracia: porque nossa liberdade corre perigo e como salvá-la. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.

NOGARA JUNIOR, G. Articulações entre o Banco Mundial e a reforma do Ensino Médio (Lei 13.415/2017). Teias, v. 20, n. 56, p. 346-351, jan./mar. 2019.

OLIVEIRA, R. A reforma do Ensino Médio como expressão da nova hegemonia neoliberal. Educação Unisinos, v. 24, p. 01-20, 2020.

PARKER, R. Quando a abstinência é um pecado contra a vida. Folha de São Paulo, 14 jan. 2020.

PERONI, V. M. V.; CAETANO, M. R.; ARELARO, L R. G. BNCC: disputa pela qualidade ou submissão da educação? Revista Brasileira de Política e Administração da Educação, v. 35, p. 35-56, jan./abr. 2019. Disponível em: https://doi.org/10.21573/vol1n12019.93094. Acesso em: 18 ago. 2023.

SARAIVA, K. S. Os sujeitos endividados e a Educação Financeira. Educar em Revista, v. 1, n. 66, p. 157-173, out./ dez. 2017. Disponível em: https://doi.org/10.1590/0104-4060.53867. Acesso em: 18 ago. 2023.

SCOTT, J. Gênero: uma categoria útil de análise histórica. Revista Educação & Realidade, Porto Alegre, UFRGS/FACED, v. 20, n. 2, p. 71-99, jul./dez. 1995.

SEFFNER, F. Sigam-me os bons: apuros e aflições nos enfrentamentos ao regime da heteronormatividade no espaço escolar. Educação e Pesquisa, v. 39, p. 145-159, 2013. Disponível em: http://www.scielo.br/ scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517-97022013 000 1000 10&lng=pt&tlng=pt. Acesso em: 18 ago. 2023

SEFFNER, F. Desigualdade, insubmissão, democracia e estratégias de equidade em questões de gênero e sexualidade. In: MARCONDES, Mariana Mazzini; OLIVEIRA, Aline Juliana Barbosa de & VALE, Felipe Beserra do. (Orgs.). Dossiê das Desigualdades. Natal, Rio Grande do Norte: SEDIS-UFRN, 2023, v. 1, p. 35-46.

Downloads

Publicado

15-05-2024

Como Citar

VERGARA RODRIGUES, C.; SEFFNER, F. Neoconservadorismo e agenda antigênero em políticas de educação no Brasil: : uma análise com foco na BNCC do ensino médio. Revista Ponto de Vista, [S. l.], v. 13, n. 2, p. 01–20, 2024. DOI: 10.47328/rpv.v13i2.16829. Disponível em: https://periodicos.ufv.br/RPV/article/view/16829. Acesso em: 7 nov. 2024.

Edição

Seção

Artigos Científicos